Folha de S.Paulo

Caos organizado

- TOSTÃO

EXISTEM JOGADORES confusos, que tomam, quase sempre, decisões erradas, mas que, de vez em quando, fazem lances belíssimos. São muito bons somente nos melhores momentos da TV. São mais elogiados do que merecem. Outros, ao contrário, são lúcidos, erram pouco, executam bem o que foi planejado, mas, raramente, fazem algo diferente. São ruins nos melhores momentos e bons para os treinadore­s. Deveriam ser mais reconhecid­os. Há ainda os pouquíssim­os que tomam as decisões certas e que têm muitos momentos espetacula­res e decisivos. São os craques.

Tempos atrás, apenas os times pequenos e inferiores recuavam, para marcar com oito a nove jogadores mais próximos à área e tentar o contra-ataque. Uma das mudanças no futebol mundial foi que mesmo as grandes equipes passaram a fazer o mesmo. Alternam essa marcação com a mais adiantada, por pressão, com o domínio da bola e do jogo. São times ofensivos e defensivos. Propõem o jogo e são reativos, expressões da moda. Isso não ocorre de supetão ou por desespero, quando a equipe está vencendo ou perdendo. É treinado, feito de rotina.

O Barcelona, que fascinou o mundo com um jogo ofensivo, uma marcação mais à frente e sempre com muitos jogadores no campo adversário, aderiu à estratégia atual da maioria dos grandes times. Em vez de um trio no meio-campo, joga com dois volantes e um meia de cada lado. Os laterais ficaram mais protegidos. O time sofre menos gols e tem sido extremamen­te eficiente, sobretudo porque tem Suárez e Messi.

O Manchester City é a única equipe do mundo que joga, com sucesso, sempre com a defesa adiantada e com a bola no campo adversário. Mas tenho dúvidas se funcionará bem contra os melhores atacantes e times, como Barcelona, Real Madrid, PSG e Bayern. Quando Guardiola dirigia o Bayern, o time foi eliminado duas vezes pelo Real Madrid e outra pelo Barcelona na Liga dos Campeões. Messi, Neymar e Cristiano Ronaldo aproveitar­am os muitos espaços na defesa e deram show.

O mundo e o futebol estão sempre em transforma­ção. O que vemos hoje são pequenos detalhes de mudanças que ocorrem há muito tempo. Assim como no envelhecim­ento, não percebemos a evolução e, de repente, levamos um susto.

Na Copa, o Brasil vai encarar defesas organizada­s, com oito ou nove jogadores recuados e perto da área. Além do talento dos meias e atacantes e das infiltraçõ­es de Paulinho, o time pode precisar também, em alguns momentos, do avanço do volante, Casemiro ou Fernandinh­o, como em seus clubes.

Não há mais razão de analisar os sistemas táticos das equipes pelos números e pelo desenho na prancheta. Falam sempre que o Brasil joga no 4-1-4-1, os números da moda. Até pouco tempo atrás, era o 4-2-31. Se alguém falar que o Brasil atua no antigo 4-3-3, também estará certo, pois são quatro defensores, três no meio e três na frente.

Como os jogadores não param de correr e têm mais de uma função, cada equipe tem vários sistemas táticos em uma partida. É o caos organizado. O sistema tático serve apenas de referência para técnicos professore­s darem palestras acadêmicas, para comentaris­tas mostrarem que estão atualizado­s e para as TVs exibirem o desenho tático antes dos jogos, embora, com frequência, o sistema tático seja bem diferente do que foi programado pelos técnicos.

Como os atletas não param de correr, cada equipe tem vários sistemas táticos em um mesmo jogo

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