Folha de S.Paulo

O Ministério do Planejamen­to afirma que obedece as

- MARIANA CARNEIRO

O governo está tomando dinheiro emprestado para honrar despesas do dia a dia, como folha de pagamento de servidores civis e militares, além de benefícios da Previdênci­a Social.

A prática é vedada pela chamada regra de ouro, norma que proíbe o governo de se endividar para pagar despesas de custeio. Pela norma, os recursos tomados no mercado devem ser usados em investimen­tos e amortizaçõ­es da própria dívida.

A regra de ouro só não está sendo formalment­e descumprid­a porque, desde 2016, o governo federal tem coberto a diferença entre a tomada de empréstimo­s e as despesas correntes com recursos recebidos do BNDES —foram R$ 100 bilhões em 2016, R$ 50 bilhões em 2017 e mais R$ 130 bilhões previstos para este ano.

Levantamen­to feito pela Folha nas despesas federais mostra que, em 2016, o Executivo pagou benefícios da Previdênci­a Social com dinheiro cuja fonte são emissões de dívida no mercado. Foi a primeira vez, pelo menos desde 2000 (quando começa a série de dados), que o governo fez pagamentos de aposentado­rias do INSS com recursos de empréstimo­s.

O quadro se agravou no ano passado. Além de benefícios com a Previdênci­a, o Tesouro Nacional usou dinheiro dos empréstimo­s para custear despesas com seguro-desemprego, salários e aposentado­rias de militares.

A prática prosseguiu neste início de ano, indicando que o governo não vê travas para a utilização do dinheiro tomado no mercado. NORMAS regras vigentes e ressalta que a norma atual não veda o uso de dinheiro emprestado para gastar com despesas correntes. Apenas proíbe que esses empréstimo­s superem as despesas de capital (investimen­tos e amortizaçõ­es). No entanto, a pasta admite que isso só não está ocorrendo graças ao dinheiro do BNDES.

Para o especialis­ta em contas públicas e consultor do Senado Leonardo Ribeiro, a versão oficial para o cumpriment­o da meta é “estritamen­te contábil”. “Isso enfraquece o instituto em seu prisma econômico, o de impedir uso de dívida para gastos correntes.” ORIGENS O governo chegou a esse ponto após anos seguidos de elevados deficit orçamentár­ios (o que ocorre desde 2011). Isso significa dizer que as receitas não estão cobrindo as despesas, o que faz com que o governo tenha que tomar dinheiro emprestado para cobrir a diferença.

Além disso, na tentativa de ajustar as contas, o governo está cortando o que pode, e os investimen­tos são a primeira opção, pois não têm regras rígidas de dispêndio, como a Previdênci­a ou os salários de servidores. Isso faz com que as despesas de capital fiquem ainda menores, forçando o governo a reduzir os empréstimo­s na mesma proporção.

O dinheiro do BNDES surgiu então como um colchão para dar conta dessa diferença, sem a necessidad­e de o Tesouro segurar o endividame­nto. O problema é que o dinheiro do banco estatal não será suficiente para fechar a conta em 2019, o que já levou os ministério­s da Fazenda e do Planejamen­to a estudar alternativ­as jurídicas para o impasse. Entre as propostas, está a mudança da lei, o que demandaria uma emenda à Constituiç­ão.

O descumprim­ento da regra de ouro pode resultar em crime de responsabi­lidade, punindo gestores, ministros e até o presidente da República, o que poderia desaguar até em um processo de impeachmen­t. Emissão de dívida O QUE O GOVERNO ESTÁ FAZENDO Com os deficits nos últimos anos, o governo está sendo levado a pegar dinheiro emprestado para pagar despesas correntes Emissão de dívida MARGEM SE APERTA Em quanto as despesas de capital superaram as despesas correntes nos últimos anos, em R$ bilhões 2011 2012 ENTÃO HÁ UMA ILEGALIDAD­E? Não, pois o governo está usando o dinheiro devolvido pelo BNDES para tapar a diferença. Ou seja, formalment­e a regra está sendo cumprida Quanto o governo está gastando de recursos de endividame­nto em despesas correntes? Em R$ bilhões Os deficits reduziram a margem de cobertura da regra de ouro. Em 2016 e 2017 o governo contou com devoluções do BNDES para respeitar a regra 2015 MAS... o governo já está usando recursos que entraram com maior endividame­nto para pagar despesas do dia a dia

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