CRÍTICA SEM AUTOCRÍTICA
Escola ligada a bicheiro condenado, Beija-Flor é campeã no Rio com desfile engajado contra corrupção e violência
Num ano marcado por enredos politizados, a BeijaFlor conquistou seu 14º título do Grupo Especial do Carnaval do Rio após levar à Sapucaí um desfile de protesto à corrupção, aos políticos, à desigualdade social, à violência e “contra tudo”.
O resultado rompeu a sina de fracasso de enredos críticos, reforçada também pelo segundo lugar da Paraíso do Tuiuti —que chegou a levar fantasia do presidente Michel Temer (MDB) como vampiro e ataques às reformas trabalhista e da Previdência. O vice-campeonato da Tuiuti foi criticado por parentes de vítimas do acidente com um carro da escola no ano passado.
A Salgueiro, que homenageou mulheres negras, ficou em terceiro lugar. Grande Rio e Império Serrano foram rebaixadas, e a Viradouro voltará à elite do Carnaval em 2019.
Terceira maior vencedora da história do Carnaval carioca (atrás de Portela e Mangueira), a Beija-Flor conquistou público e jurados com um desfile contestador apesar do “teto de vidro” da escola.
O bicheiro Aniz Abraão David, 80, conhecido como Anísio da Beija-Flor, é patrono e presidente de honra da agremiação, na qual ele dá as cartas desde os anos 1970. Condenado pela Justiça a 48 anos de prisão após ser acusado de ser um dos chefes da máfia do jogo do bicho no Rio, ele está agora em liberdade.
Questionado antes do desfile sobre a ligação da escola com a contravenção, ao mesmo tempo em que levava ao sambódromo críticas à corrupção e à violência, Gabriel, 20, filho de Anísio e que assume aos poucos a função do pai, disse preferir “não pensar sobre isso”.
“Não quero me limitar e não falar de uma coisa que acho importante. O momento que vivemos pede um enredo assim, ainda mais em ano de eleição”, afirmou.
Na apuração, Neguinho da Beija-Flor, intérprete da escola, disse que “a escola falou o que o povo gostaria de falar. Quanto a isso [contravenção], eu não falo.”
No desfile, a Beija-Flor levou fantasias criticando impostos altos, ratos em referência a políticos, alusões à “farra dos guardanapos” (jantar com políticos em Paris) e encenações da rotina de violência no Rio, com representações de crianças em caixões e mães chorando por seus filhos policiais mortos.
Agremiação de Nilópolis, na região metropolitana do Rio, a Beija-Flor fez sucesso com a arquibancada da Sapucaí, que seguiu cantando a letra do samba depois do fim do desfile, e chegou a receber aplausos de jurados.
Este é o segundo ano consecutivo em que ela rompe com sua estética tradicional. Em 2017, a escola desfilou sem alas, e o resultado não agradou público nem jurados. A escola terminou em 6º lugar.
A Beija-Flor repetiu em 2018 um feito de 2003, quando também fez um Carnaval político, mas em homenagem ao então presidente Lula (PT), que havia acabado de assumir. Aquele havia sido o último desfile campeão com tom político no Rio de Janeiro. HISTÓRIA A história do Carnaval carioca é mais marcada por enredos positivos do que críticos. Durante a ditadura, muitas escolas fizeram enredos chapa-branca, principalmente a Beija-Flor. No entanto, há exemplos antológicos de desfiles que marcaram, apesar de não terem ganhado.
No Carnaval de 1989, a mesma Beija-Flor, à época com o carnavalesco Joãosinho Trinta, levou para a avenida o enredo “Ratos e Urubus, Larguem Minha Fantasia”, que mostrava mendigos, bêbados e menores carentes do Brasil. A imagem que mais marcaria seria o carro com a