Folha de S.Paulo

Ramaphosa é eleito para suceder Zuma

Ex-vice presidente da África do Sul assume com discurso anticorrup­ção, calcanhar de Aquiles de seu partido

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Polícia do país promove operação centrada em família acusada de subornar mandatário que renunciou na 4ª

O Parlamento da África do Sul elegeu nesta quinta-feira (15) Cyril Ramaphosa, 65, presidente do país, um dia depois que Jacob Zuma, 75, renunciou ao cargo que ocupava desde 2009 em meio a acusações de corrupção.

Seu nome foi referendad­o pelo Parlamento sul-africano, em processo que se assemelha à escolha de um primeiro-ministro em um regime parlamenta­rista. A oposição boicotou a votação, por desejar a dissolução da Casa e a antecipaçã­o da eleição geral prevista para 2019.

Vice a partir de 2014, quando Zuma se reelegeu, Ramaphosa travava uma queda de braço com o presidente há dois meses, ao ser eleito presidente do Congresso Nacional Africano (CNA), partidos de ambos e de Nelson Mandela (1918-2013).

A partir de então, passou a antagoniza­r com o atual presidente. Zuma é acusado, entre outros crimes, de usar R$ 50 milhões dos cofres públicos para reformar a própria casa —a Suprema Corte determinou em 2016 que ele deveria ressarcir a União, mas ele recorre da decisão.

A Justiça também analisa a acusação de que Zuma teria sido subornado pela fabricante francesa de armamentos Thales no fim dos anos 1990, quando o governo sul-africano fechou aquisições de equipament­os na casa dos US$ 2,5 bilhões.

A ele foi oferecida uma recompensa anual de US$ 41 mil (em valores atualizado­s), segundo um ex-advogado da empresa. Há outra acusação de recebiment­o de propina e favores de uma empresa controlada por indianos.

Zuma sempre negou todas as acusações. Em 2016, o então presidente enfrentou uma votação de impeachmen­t e venceu.

Os escândalos mancharam seu histórico como um dos líderes da luta pelo fim de apartheid ao lado de Mandela e arranharam a imagem do CNA. Foi daí que Ramaphosa assumiu a imagem de combate à corrupção, embora a oposição tenha acusado a sigla de encobrir as acusações contra Zuma por anos.

A ofensiva do CNA e de Ramaphosa contra Zuma veio no início do mês. No fim de semana, ele já havia concordado em deixar o cargo, mas impusera condições.

A resposta do CNA veio sob a forma de ultimato. Como o presidente se recusava a atendê-lo, o partido anunciou que apoiaria o voto de desconfian­ça pedido pela oposição no Parlamento, o que na prática forçaria sua saída.

Parte da cúpula do CNA teme que a derrocada do agora ex-presidente prejudique o partido nas próximas eleições, abrindo espaço para a ascensão de uma oposição que nunca esteve no poder. INDIANOS Também na quinta, a polícia sul-africana deu prosseguim­ento a uma operação anticorrup­ção que tem entre seus alvos a família Gupta, ligada a Zuma —e suspeita de pagar propina a ele para obter contratos com o governo, além de buscar influencia­r a formação de seu gabinete.

Ajay Gupta, um dos três irmãos que comandam os negócios do clã em setores como mineração, aviação civil, tecnologia e energia (num conglomera­do que emprega 10 mil pessoas e tem receita anual de US$ 20 milhões), é considerad­o foragido.

Entre os presos no âmbito da ação está Verun Gupta, sobrinho de Ajay. Oito pessoas já foram detidas no curso da investigaç­ão sobre o desvio de recursos de uma fazenda estatal voltada à produção de laticínios para uma empresa que tem elos com os Gupta.

Além das acusações de propina em licitações, o conglomera­do já empregou uma das mulheres de Zuma e dois dos seus 20 filhos. Uma delas, Duduzile, manteve-se em uma das diretorias da empresa até 2016.

 ?? Mike Hutchings/Reuters ?? Cyril Ramaphosa, eleito para presidir a África do Sul até o pleito do ano que vem, chega ao Parlamento, na Cidade do Cabo, nesta quinta-feira (15)
Mike Hutchings/Reuters Cyril Ramaphosa, eleito para presidir a África do Sul até o pleito do ano que vem, chega ao Parlamento, na Cidade do Cabo, nesta quinta-feira (15)

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