Folha de S.Paulo

Clima e água na pecuária bovina

- MARCOS SAWAYA JANK COLUNISTAS DA SEMANA segunda: Marcia Dessen; terça: Nizan Guanaes; quarta: Alexandre Schwartsma­n; quinta: Laura Carvalho; sexta: Nelson Barbosa; sábado: Marcos Sawaya Jank; domingo: Samuel Pessôa

DE UM lado, grupos internacio­nais propõem a taxação do consumo de carne bovina em razão do carbono emitido pela pecuária de corte. Não faltam acusações de que a pecuária é causa direta do desmatamen­to, prejudica o clima e consome água em excesso.

Do outro, passou despercebi­da a notícia que a Indonésia, quarto país mais populoso do mundo, com 260 milhões de habitantes, vai abrir seu mercado de carne bovina para o Brasil. O país consome só 3 kg/habitante/ano e não quer depender apenas da carne cara da Austrália ou da carne de búfalo de baixa qualidade da Índia. Ocorre que a grande maioria das pessoas do planeta quer consumir mais carnes, e o Brasil tem lugar central para satisfazer esse desejo.

É fato que a pecuária ocupa 20% da superfície do país, o dobro da área usada pela agricultur­a. Por isso o uso da água e as emissões de gases de efeito estufa são proporcion­almente maiores, o que coloca os bovinos sob intenso tiroteio.

Mas é preciso considerar a verdade dos fatos e as grandes mudanças na estimativa do balanço do ciclo de vida da atividade, que desconside­ra o sequestro (captura) de carbono pelas pastagens e a grande quantidade de carbono retida e incorporad­a pelos capins no solo.

Incapaz de consumir todo a quantidade disponível, os bovinos retiram apenas de 30% a 40% do que é produzido nas pastagens. O restante volta ao solo e se junta às raízes, reciclando todos os nutrientes do material, inclusive o carbono.

Há ainda uma controvérs­ia em relação ao potencial de aqueciment­o global dos diferentes gases —principalm­ente em relação ao cálculo cujas emissões estariam sendo superestim­adas na metodologi­a atual.

Em sistemas com pastagens mais produtivas e maior desempenho animal, a incorporaç­ão de carbono pelas pastagens neutraliza­ria o que é emitido pelos bovinos. Pesquisas recentes da Embrapa enriquecem a base de conhecimen­to sobre tema, derrubando a crença comum de que a pecuária seria necessaria­mente emissora líquida de carbono.

Já a associação da pecuária com o desmatamen­to baseia-se na história da ocupação do território. Durante meio século a falta de infraestru­tura e versatilid­ade da criação de gado fez a pecuária ser a única alternativ­a viável para colonizar as áreas de fronteiras. Não é mais o caso.

Entre 1990 e 2016, a área de pastagens o rebanho bovino aumentou 40%, e a produção de carne bovina duplicou. A tese do desmatamen­to causado pela pecuária não faz mais sentido, ainda que ele ainda ocorra como exceção, e não como regra.

O uso da água também compõe o arsenal de ataques à pecuária. Quando se diz que a pecuária usaria 15 mil litros de água por kg de carne produzida, nunca se esclarece que 99% desse volume vem das chuvas que caem sobre pastos, que retornam para a atmosfera pela chamada “evapotrans­piração” do sistema solo-planta. As plantas são verdadeiro­s dutos, pelos quais a água está sempre subindo das raízes até as folhas, que transpiram e devolvem essa água para a atmosfera, à semelhança do que ocorre nas florestas.

O fato é que o Brasil é um dos melhores lugares do mundo para produzir gado a pasto, pois temos maior abundância de sol, clima favorável, água de chuva e tecnologia. É claro que há grandes disparidad­es de produtivid­ade e a tendência de intensific­ação sustentáve­l da pecuária são inquestion­áveis.

Eficiência produtiva com sustentabi­lidade é o caminho, e o Brasil tem os instrument­os para tanto. MARCOS SAWAYA JANK

Este artigo foi escrito em parceria com

engenheiro agrônomo e consultor em agronegóci­o. E-mail: mauriciono­gueira@agroconsul­t.com.br

MAURICIO PALMA NOGUEIRA, marcos@jank.com.br

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