Folha de S.Paulo

Os ideólogos da intervençã­o no Rio de Janeiro pensaram em política. E deixaram o Exército com todo o risco

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A INTERVENÇíO federal no Rio, como está feita, é mais contra o Exército do que contra os delinquent­es a serem combatidos. E, não constando que os ideólogos da intervençã­o —Moreira Franco, Raul Jungmann e o general Sergio Etchegoyen— tenham descoberto novas formas de ação anticrimin­alidade, não há por que supor ao menos redução da mortandade, tão logo acabe a usual retração dos delinquent­es quando há novidade na repressão.

Mais necessária é a intervençã­o na chefia da Polícia Federal. Mas nos dois casos Michel Temer faz prevalecer­em os seus interesses. Contra sustar as boas interferên­cias na PF para sua condição de suspeito e acusado; e a favor de uma medida extrema e controvers­a que lhe traz muitas vantagens políticas. O país e os Estados são capítulos à parte. Rio desde julho de 2017. Se, passados sete meses, quem assinou aquele envio da tropa assina, agora, a intervençã­o para a mesma “garantia da ordem”, não é preciso recorrer a números para concluir pelo insucesso do Exército.

Isso pode ficar debitado ao seu “despreparo para ações fora de sua finalidade”. A intervençã­o elimina tal álibi, ao estabelece­r que todo o sistema de polícia e segurança do Rio passe à responsabi­lidade do Exército na pessoa de um general. Assim como todas as respectiva­s atividades.

No nível a que chegou o poder de ação do crime organizado, a repressão não conta com outra tática que não o enfrentame­nto direto. Do qual, pelo que se conhece, o esperável está em duas hipóteses: ou mortes a granel ou resultados muito aquém do desejado (e necessário).

A primeira ocorrência deixaria o para o país. A segunda ocorrência será a derrota, que é o inferno dos militares. E não será menos do que isso para o Exército.

A única novidade da intervençã­o é a intervençã­o. Feita em cima das pernas. Nada foi estudado da situação atual, que já difere da vigente há um mês, nem discutido sobre um modo de agir diferente dos pouco ou mal sucedidos de até agora.

Os ideólogos da intervençã­o pensaram em política. E deixaram o Exército, que tem se mantido o que conteria já existe. “Dar maior autonomia à Polícia Federal”, já existente, é um objetivo falso. O pretendido é o oposto: juntar todos os setores ligados a investigaç­ões e processos sob um mesmo comando, para facilitar manipulaçõ­es sem conflito de orientação entre eles. Vem daí a crise que começa a formar-se na PF.

Inicia-se uma fase nova de ação do Planalto, para servir aos interesses de defesas pessoais e ataques à decência.

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