Folha de S.Paulo

Corte de Trump deve piorar vida de palestinos em campo no Líbano

Em Ein el Hilweh, 80 mil refugiados dependem de ajuda financeira dos EUA a agência da ONU

- PATRÍCIA CAMPOS MELLO LALO DE ALMEIDA

Maior campo libanês de palestinos tem mais de 20 facções em guerra, e alunos de escola ficam no meio de fogo cruzado

Das menores, de seis anos, até as adolescent­es, todas as alunas da escola Marj ben Amer sabem a rotina.

Assim que escutam o familiar barulho de tiroteio, escondem-se embaixo das mesas. Depois, seguem a linha verde desenhada no chão, que as conduz até o “safe room”. Trata-se de uma sala com películas especiais nas janelas, para evitar que estilhacem, cercada com muros duplos, para conter as balas.

Pelo alto-falante, são orientadas pela diretora para a saída: não gritem, não voltem para procurar seus irmãos. Todos foram treinados pelo Comitê Internacio­nal da Cruz Vermelha.

Em Ein el Hilweh, o maior campo de refugiados palestinos do Líbano, mais de 20 facções estão em guerra.

Tradiciona­is organizaçõ­es palestinas como Hamas e Fatah lutam contra facções de extremista­s islâmicos, como o Estado Islâmico, a Jabhat Fatah al-Sham (antiga Jabhat al-Nusra) e a milícia local Jund al-Sham.

A escola Marj ben Amer fica bem no meio do fogo cruzado —no ano passado, ficou fechada por 27 dias por confrontos, que acontecem em média uma vez a cada dois meses. Às vezes, atiradores se escondem dentro das salas de aula. Não raro, usam lançadores de granadas.

Além da violência, a pobreza também é regra no campo. Os palestinos do Líbano são proibidos de exercer quase 40 profissões, entre elas medicina, engenharia e direito.

Amaioriado­srefugiado­svive de bicos, trabalha na construção ou fazendo limpeza. Mais de metade depende de ajuda financeira da UNRWA, a agência da ONU que atende a refugiados palestinos.

Com o conflito sírio, mais 40 mil palestinos que se abrigavam na Síria foram para o Líbano. Em Ein el Hilweh, a população explodiu —hoje, cerca de 80 mil refugiados vivem em apenas 1,5 quilômetro quadrado cercado por um muro, em casas cheias de marcas de balas, semidestru­ídas por bombas.

A densidade demográfic­a no campo é de 53.333 habitantes por quilômetro quadrado —sete vezes maior que a da cidade de São Paulo.

Segundo Christophe Martin, chefe da delegação do CICV (Comitê Internacio­nal da Cruz Vermelha) no Líbano, o órgão se inspirou no projeto que implantou em comunidade­s do Rio para proteger escolas. A diferença é que, no Rio, o problema é o tráfico de drogas. Aqui, a violência é política e religiosa.

“Sabemos que é difícil, somos apenas os bombeiros apagandoum­incêndioaq­ui.” CORTE DE VERBA que são atendidos por ela.”

Os refugiados não são proibidos de se movimentar, mas o Exército libanês controla a entrada e a saída do campo de Ein el Hilweh. Lá dentro, no entanto, é terra sem lei.

Seguindo um acordo, forças libanesas não entram nos campos palestinos, que gerem a própria segurança. Homens com metralhado­ras circulam em meio a muros com fotos do líder palestino Iasser Arafat (1929-2004).

“No dia do confronto, as crianças até aguentam bem. Mas no dia seguinte, têm ataques de choro, ficam irritadas e brigam por qualquer coisa”, diz Ayoub. No ano passado, foram mortos pais de várias crianças —muitas perderam as casas, chegaram à escola sem livros e sem uniforme.

“Vivia uma vida ótima na Síria, a gente tinha nossa casa, eu tinha roupas bonitas. Saí por causa da guerra”, diz Maram, 14, que deixou a cidade de Damasco em 2013.

“Aqui, é como se fosse guerra, preciso controlar o medo para poder vir à escola”, conta, enquanto alunos caminham com faixas na cabeça com os dizeres “Jerusalém é a capital da Palestina”. HOSPITAL Área: 10.400 km² (igual a dois DF)

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Rua no campo de refugiados palestinos de Ein el Hilweh, o maior do Líbano; mais de 80 mil pessoas moram em meio à violência em um espaço total de 1,5 quilômetro quadrado

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