Folha de S.Paulo

Protestos no Irã contra véu islâmico ganham fôlego

Ao menos 29 pessoas foram detidas em fevereiro, a maioria delas mulheres

- DIOGO BERCITO

Para ativista radicada nos EUA, ‘há uma luta diária entre governo e população, entre dois estilos de vida’

Com um pedaço de pano e um graveto, mulheres iranianas têm desafiado o regime que há décadas decide como elas devem se vestir.

Dezenas delas removeram o véu islâmico de seu cabelo e, de pé no meio-fio, agitaram-no na ponta de uma vara. Ao menos 29 pessoas foram detidas em fevereiro, a maior parte delas mulheres, segundo a polícia.

Não é a primeira vez que esse tipo de movimento surge nas ruas de Teerã, mas os protestos têm encorpado e ganhado visibilida­de.

Os gestos coincidem com a divulgação de um estudo encomendad­o pelo governo apontando que 49% dos iranianos são contrários à imposição do hijab, como é chamado esse véu.

“O hijab incomoda as mulheres iranianas há quatro décadas, desde a Revolução de 1979”, diz à Folha a ativista Masih Alinejad, 42, radicada nos Estados Unidos. “Não somos as primeiras a fazer esse tipo de campanha, mas espero sermos as últimas.”

Alinejad foi a responsáve­l por duas importante­s ondas de manifestaç­ão contra o véu no Irã e, com seu ativismo on-line, teve um papel decisivo na populariza­ção dos protestos atuais.

Ela fundou em 2014 o projetoMyS­tealthyFre­edom(minha liberdade furtiva), reunindo em um site fotografia­s de mulheres sem o hijab.

No ano passado, criou o movimento White Wednesdays (quartas-feiras brancas), convocando iranianas para uma vez por semana vestir apenas véus dessa cor —como aqueles colocados recentemen­tenapontad­egravetos.

Ao anunciar a prisão dos 29 ativistas contra o hijab, a polícia iraniana citou a Quarta-feira Branca por nome, dizendo que o movimento é uma propaganda fomentada por forças externas.

“Como o governo nos atacou, entendo que nos ouviram. Mas agora todo o Irã pede que as mulheres detidas sejam libertadas. É uma oportunida­de para que o presidente iraniano, Hasan Rowhani, demonstre que é de fato moderado”, diz.

Apesar de não esperar que o país se transforme imediatame­nte, eliminando a imposição do véu no dia seguinte, e mesmo com a detenção de diversas das ativistas da Quarta-feira Branca, Alinejad afirma que já venceu essa batalha.

“Há uma luta diária entre o governo e a população, entre dois estilos de vida diferentes. Eles têm o poder e as prisões e nós temos as redes sociais. Não é justo, mas ganhamos ao romper a censura. Agora a nossa população entende que poder tem.”

Os protestos contra o véu islâmico coincidem com manifestaç­ões mais amplas em dezenas de cidades, em parte motivadas pelas agruras econômicas.

O desemprego entre os jovens ultrapassa os 40% em algumas regiões do país. O governo deteve quase 5.000 manifestan­tes desde o início do ano, segundo o parlamenta­r iraniano Alireza Rahimi.

O regime responsabi­lizou os “inimigos da República Islâmica” pelos protestos, em um recado aos Estados Unidos e à Arábia Saudita. DOMINAÇÃO

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Toby Melville - 8.out.13/Reuters A ativista iraniana Masih Alinejad, que hoje vive nos EUA

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