Folha de S.Paulo

Legal igual a moral?

- SAMUEL PESSÔA COLUNISTAS DA SEMANA segunda: Marcia Dessen; terça: Nizan Guanaes; quarta: Alexandre Schwartsma­n; quinta: Laura Carvalho; sexta: Nelson Barbosa; sábado: Marcos Sawaya Jank;

HÁ ALGUM tempo a categoria de juízes vem sendo exposta em razão do auxílio-moradia. O benefício é pago independen­temente de o magistrado ter imóvel próprio na cidade em que trabalha.

Os juízes argumentam que a concessão do benefício é legal e, portanto, não há problema moral em requerê-lo. O juiz Sergio Moro argumentou que o benefício compensa os salários congelados há três anos. Faltou lembrar que os impostos também não crescem há três anos.

Apesar da legalidade, a percepção é que o benefício é imoral.

O colunista Eugênio Bucci, na edição de quinta (15) do jornal “O Estado de S. Paulo”, afirmou que o governo estereotip­ava os servidores públicos como privilegia­dos. Os servidores públicos somente “acreditara­m na promessa do Estado de que, se topassem trabalhar recebendo proventos limitados, (...) teriam, no final da vida, uma aposentado­ria digna”. Recente estudo do Banco Mundial mostrou que o Estado brasileiro do que o setor privado. A prática mundial é que esse “excesso” de remuneraçã­o do setor público seja de 15%. Não parece que os proventos sejam “limitados”.

Bucci esqueceu que a reforma da Previdênci­a em tramitação no Congresso Nacional não elimina os princípios de integralid­ade e paridade do benefício previdenci­ário dos servidores, mas apenas determina que serão garantidos para os que se aposentare­m com 65 anos para homens e 62 anos para mulheres. Parece que são idades razoáveis

Os dois princípios mencionado­s estabelece­m que o servidor se aposenta com o último salário e tem a garantia de receber todos os aumentos reais concedidos aos ativos.

Adicionalm­ente, a população em geral entende que poder se aposentar com 55 anos, por exemplo, e ser elegível à paridade e à integralid­ade é privilégio. Parece ser o caso. Vale lembrar que as pressões dos servidores sobre os deputados para que a reforma não ande são fortíssima­s. E eles sempre aos servidores dos Estados. E os Estados estão quebrados. Para os Estados, o principal motivo da quebradeir­a é a folha de servidores ativos e inativos. As regras previdenci­árias fazem com que hoje um Estado, para cada coronel da PM da ativa, por exemplo, pague de 20 a 30 benefícios para inativos ou suas viúvas.

No Carnaval, pegou muito mal a informação de que o apresentad­or Luciano Huck se beneficiou de um empréstimo do BNDES a taxas de juros reais negativas para comprar um jatinho. Tudo legal. A percepção é que houve privilégio.

O grande problema é tratarmos os iguais de forma desigual. Vale para os servidores, vale para os regimes especiais de tributação, Simples a sua meia-entrada como sendo plena de justificat­iva e de razões.

O desempenho de nossa economia nos últimos 35 anos sugere que essa economia política não está funcionand­o bem. Excelente indicação de leitura é “Por que o Brasil Cresce Pouco?” de Marcos Mendes, editado pela Campus. SAMUEL PESSÔA,

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