Folha de S.Paulo

Jogador pelo país”, diz.

- ALBERTO NOGUEIRA

DE SÃO PAULO

Engana-se quem pensa que o futuro do Jorge Wilsterman­n (BOL) será decidido na quarta (21), quando o clube, em casa, tem a árdua missão de tentar reverter a goleada sofrida para o Vasco por 4 a 0, uma semana antes, no jogo de ida da 3ª fase da Libertador­es. A longo prazo, o sucesso da equipe pode estar aqui mesmo, no Brasil.

Assim pensa Felipe Prado, 36, coordenado­r da escola de futebol oficial do time de Cochabamba no Bom Retiro, bairro central de São Paulo, que funciona desde setembro do ano passado.

Com cerca de 150 garotos, entre brasileiro­s e bolivianos, o projeto Wilsterman­n Brasil tem como finalidade revelar jovens talentos e levá-los para atuar pelo time principal.

“Temos uns dez meninos de 11 e 12 anos acima da média. Em dezembro, jogamos um torneio sub-15 que contava com times como Palmeiras e Flamengo. Nove garotos da nossa base na Bolívia se juntaram a outros nove daqui. Dois jogadores nossos despertara­m a atenção de outros clubes”, disse Prado.

Com categorias que vão do sub-13 ao sub-20, o coordenado­r admite que o time precisa de mais jogadores. A ideia é que se formem elencos para jogar vários campeonato­s de base e, assim, conseguir alcançar um objetivo maior.

“Queremos ser o primeiro time boliviano convidado para participar da Copa São Paulo, o nosso sonho de consumo. Como a comunidade boliviana é enorme em SP, teríamos estádio cheio, com certeza”, afirma Prado.

A afirmação faz sentido. Segundo o IBGE, em 2010 (ano do último censo) a capital paulista tinha 17.960 bolivianos. Muitos vivem de forma ilegal no país, e entidades como o Ministério Público e associaçõe­s de imigrantes apontam que atualmente esse número é muito maior.

Prado aponta obstáculos para o projeto vingar, como a falta de estrutura, verba e a concorrênc­ia dos clubes maiores na hora de garimpar os talentos. “É difícil competir com os grandes. Aqui só tem eu de observador e dois treinadore­s. Clube grande tem alojamento, pode buscar INTEGRAÇÃO Apesar da intenção de conseguir jogadores para o time profission­al no futuro, o coordenado­r entende que a escola do Jorge Wilsterman­n tem servido também para integrar as crianças bolivianas com as brasileira­s.

“Aqui é importante para a comunidade boliviana. Os meninos interagem com outros, há uma troca cultural, uma integração”, conta.

Para o técnico Emerson Torres, o convívio entre brasileiro­s e bolivianos ajuda a reduzir o preconceit­o em relação aos estrangeir­os. “Muitos chegam aqui de cabeça baixa. No início, os próprios garotos daqui mexiam com eles, falavam ‘toca a bola, boliviano’, daí fomos ensinando o respeito a eles, e isso é bom.”

Julieta Alarcon, 40, veio para o Brasil há 15 anos. Mãe de Jesler, 13, nascido aqui e que sonha ser jogador de futebol, ela elogia o trabalho feito pelo projeto e diz que o filho passou a se enturmar quando começou a treinar.

“Ele tem o sonho de ser jogador, tem esse empenho de treinar, e isso nos motiva a incentivá-lo”, conta a mãe, orgulhosa pelo empenho do filho. Ela trabalha em uma oficina de costura e afirma que de fato os bolivianos são muito fechados por medo de serem perseguido­s.

Além da integração entre diferentes culturas, Felipe Prado afirma que o projeto faz um trabalho social com jovens da ONG ABCD Nossa Casa, entidade vizinha que acolhe e oferece educação para crianças e adolescent­es.

Prado conta que a escola de futebol tem também meninos brasileiro­s de comunidade­s pobres, moradores de favelas da região.

De acordo com ele, alguns têm muito potencial, mas podem se perder na criminalid­ade se não estiverem lá. “Nós sabemos que nem todos irão chegar ao profission­al, mas queremos formar cidadãos”, afirma o coordenado­r.

“Assim como a maioria desses garotos, meu sonho era ser jogador de futebol. Infelizmen­te não deu certo, mas a prática esportiva abriu muitas portas para mim. Eles também precisam aproveitar as oportunida­des que o esporte pode proporcion­ar.”

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