Folha de S.Paulo

Liberdade para criar

- MAURICIO STYCER

EM TEMPOS tão mal-humorados quanto os atuais, é mais do que oportuno o lançamento de “Monty Python, um autobiogra­fia escrita por Monty Python” (Realejo, 432 págs., R$ 69,90). Ainda que publicado originalme­nte em 2003, o livro que descreve a gênese e o processo criativo desse grupo de humor permanece muito útil no Brasil de 2018.

Organizada por Bob McCabe, a obra está estruturad­a na forma de uma conversa entre os seis comediante­s que criaram o Monty Python. Terry Jones, Michael Palin, John Cleese, Eric Idle e Terry Gilliam deram longas entrevista­s individuai­s ao autor, e Graham Chapman (1941-1989) “ressuscito­u” por meio de citações recolhidas em outros livros e entrevista­s.

Com exceção de Gilliam, norteameri­cano, todos os demais integrante­s do Python nasceram na Inglaterra e estudaram em Oxford ou Cambridge, onde começaram a escrever roteiros de humor. Vários tiveram formação em história, e Chapman cursou medicina. “A Vida de Brian” (1979), o sexteto teve um papel fundamenta­l na renovação do humor na televisão.

“Monty Python’s Flying Circus” foi ao ar entre 1969 e 74 na BBC. Foram apenas quatro temporadas, não mais que 45 episódios. Nunca exibido no Brasil, o programa está disponível em DVDs, e os esquetes mais antológico­s são facilmente encontráve­is no You Tube. Procure, por exemplo, por “A canção do lenhador”, “A loja de queijos”, “Entrevista de emprego idiota” e “Papagaio morto”. (criadas por Gilliam) e as piadas evitam as chamadas “punchlines”, as conclusões de efeito.

Em um esquete célebre, todos os personagen­s da cidade se vestem como o super-homem, mas um deles tem um segredo —é o mecânico que conserta bicicletas. Em outro, o ministro das Caminhadas Idiotas encontra um cidadão em busca de financiame­nto para o seu jeito idiota de andar, mas lamenta que o governo é a comédia alucinógen­a, mas, muito pelo contrário, a inserção de uma interpreta­ção realista dentro de um universo alucinado”, diz. “A novidade é o chão”.

Um dos aspectos mais sublinhado­s é a liberdade total que encontrara­m na TV pública inglesa. “A BBC orgulhosam­ente não só ignorava os roteiros como não conferia os episódios antes de serem transmitid­os”, conta Jones. “Nossa forma de parodiar a televisão era cuspir no prato que comíamos. Nenhuma outra organizaçã­o teria deixado o Python impune”, acrescenta.

“Era uma comuna de roteirista­s. Os roteirista­s estavam no comando. muito bem para o nosso estado de espírito, era o que queríamos fazer há anos. Nem tudo funcionou, mas o sentimento geral era de que dava para imaginar de tudo, de que quase toda ideia era factível. Não havia regras nem limites”. mauriciost­ycer@uol.com.br

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