Folha de S.Paulo

O ‘S’ dos Brics

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As semelhança­s com o Brasil são notáveis. Piora no desempenho econômico, instituiçõ­es capturadas pela corrupção, degradação da qualidade do governo e perda de legitimida­de de um grande partido que se pretendia popular.

Foi o que se passou na África do Sul nos últimos anos, culminando com a renúncia de Jacob Zuma em favor de Cyril Ramaphosa, seu exvice e presidente do CNA —o partido que abrigou Nelson Mandela e governa o país há 24 anos.

Trata-se da maior economia do continente africano, a letra “S” (de South Africa, na língua inglesa) dos Brics, acrônimo criado na década passada para designar os emergentes então considerad­os de maior potencial (Brasil, Rússia, Índia e China são os demais).

A corrupção é uma chaga nas cinco nações, mas até aqui foi no Brasil e na África do Sul que chegou a compromete­r o funcioname­nto do Estado a ponto de desencadea­r transforma­ções políticas.

O ex-presidente Zuma, de fato, atingiu o paroxismo em termos de desmandos e inoperânci­a, permitindo o tráfico de influência em escala tida como inédita.

Constituír­am estopim para sua renúncia forçada as relações com os irmãos Gupta, indianos bilionário­s acusados de pagar propinas em troca de acesso a negócios com o governo. Repete-se no caso a história de instituiçõ­es frágeis capturadas por elites com acesso privilegia­do a recursos públicos.

Mesmo não tendo passado ainda por uma profunda recessão, a África do Sul amarga um desempenho econômico ruim. O cresciment­o vem declinando há uma década e hoje está em 1% ao ano, enquanto a taxa de desemprego permanece em torno de desastroso­s 30%.

A educação é sofrível. Não se superou até hoje o legado de desigualda­de entre brancos e negros —e cresce a disparidad­e entre a elite que emergiu depois do fim apartheid e o resto do país.

O CNA tem culpa por isso. Sua permanênci­a no poder, mesmo depois de diversos escândalos, reflete sem dúvida a hegemonia conquistad­a na épica luta contra a segregação; entretanto é também mostra da dificuldad­e de regeneraçã­o do sistema político. A força das instituiçõ­es sul-africanas ainda deve passar por novos e duros testes.

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