Folha de S.Paulo

Caixas-pretas

Supersalár­ios do BNDES dão mostra de que é imperativo conferir transparên­cia aos gastos com os mais de 500 mil funcionári­os das estatais

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Não há como evitar o espanto diante da revelação, por esta Folha, de que a remuneraçã­o média total dos diretores do BNDES, o banco federal de fomento, ultrapassa a casa dos R$ 100 mil mensais.

Não apenas pelas dimensões das cifras, ainda que estas sejam inimagináv­eis para a esmagadora maioria da população, mas em especial por informaçõe­s como essa só estarem chegando agora ao conhecimen­to público.

Argumenta a instituiçã­o estatal que os salários e outros benefícios pagos a seus dirigentes são inferiores aos observados em grandes bancos privados. Compreende-se, decerto, a necessidad­e de atrair profission­ais qualificad­os para os postos de comando.

Entretanto o Banco Nacional de Desenvolvi­mento Econômico e Social, fundado em 1952, pertence integralme­nte ao governo federal e atua no financiame­nto de projetos de longo prazo sem ter de se preocupar com competidor­es.

Sua administra­ção tampouco precisa esforçar-se na busca de depositant­es. O banco conta com uma fonte permanente de recursos do contribuin­te brasileiro, na forma de 40% da arrecadaçã­o do PIS e do Pasep —para nem mencionar as injeções multibilio­nárias de recursos do Tesouro Nacional desde o final da década passada.

Por tudo isso, no mínimo seria obrigatóri­a a divulgação transparen­te da estrutura de remuneraçõ­es do BNDES, para a avaliação de custos e benefícios.

Mal se começa a avançar nesse sentido. Em local de difícil acesso em seu site, o banco informa os vencimento­s da diretoria somente a partir de setembro passado. Quanto aos demais servidores, o balanço informa o salário médio, de R$ 25 mil em junho de 2017, e o maior, de R$ 70 mil.

Haveria a considerar ainda benefícios como generosa participaç­ão nos lucros, gratificaç­ão mensal generaliza­da e auxílios diversos.

Recorde-se que o governo federal controla diretament­e 48 empresas, às quais estão ligadas 101 subsidiári­as. Este universo abriga 507 mil funcionári­os, contratado­s sob condições bem mais flexíveis que as válidas para o quadro de pessoal dos ministério­s —não estão sujeitos, por exemplo, ao teto salarial de R$ 33,8 mil mensais.

Muito pouco se sabe sobre quanto e como se gasta com esse contingent­e. No ano passado, o Tribunal de Contas da União decretou auditoria sobre as folhas de pagamento das estatais. Iniciativa mais que bem-vinda, embora tardia.

Historicam­ente, uma aliança entre as corporaçõe­s e políticos ávidos por cargos nas empresas tem dificultad­o a divulgação e o debate dos dados. Que a trágica ruína das finanças públicas sirva ao menos para romper o pacto de proteção a essas caixas-pretas.

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