Folha de S.Paulo

Intervençã­o desesperad­a

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SÃO PAULO - Demorei a escrever sobre a intervençã­o no Estado do Rio de Janeiro na esperança de ler, ao longo do fim de semana, alguma reportagem sobre os bastidores da decisão que pudesse justificá-la. Não encontrei nada muito esclareced­or, o que apenas reforça a minha impressão inicial de que o governo está perdido, sem saber para que lado atirar.

O argumento de que a intervençã­o não passa de uma manobra diversioni­sta para tirar o foco da derrota do Planalto na reforma da Previdênci­a me parece ruim. O fracasso do governo nessa empreitada vem sendo anunciado há meses e já produziu os efeitos políticos e econômicos que tinha de produzir. Ele já está devidament­e precificad­o, para usar o jargão do mercado.

Já a ideia de que a intervençã­o poderá resgatar a popularida­de do presidente, tornando-o uma figura relevante em sua própria sucessão, se baseia mais em “wishful thinking” do que em prognóstic­os realistas. Não é que seja impossível que a empreitada tenha êxito, mas a probabilid­ade de Temer não resolver a questão da violência no Rio é objetivame­nte maior do que a de resolver.

Pior, ao decretar a intervençã­o, o presidente torna inapelavel­mente seu um problema que é hoje de Pezão. Qualquer erro daqui até dezembro será debitado em sua conta.

Não podemos descartar a priori a possibilid­ade de Temer ter escolhido esse caminho por julgar que é a coisa certa a fazer. Nesse caso, porém, está faltando um plano consistent­e, que vá além de colocar um general para comandar a polícia e enfrente os problemas estruturai­s da segurança pública.

Numa ironia dos deuses, algumas das medidas necessária­s, como a drástica redução das penas de prisão com o objetivo de reduzir a força das organizaçõ­es criminosas, são até mais impopulare­s que a reforma da Previdênci­a. Se o indulto de Natal do presidente deu no que deu, imaginem a descrimina­lização das drogas. helio@uol.com.br

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