Folha de S.Paulo

Casca grossa

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RIO DE JANEIRO - Minutos depois de decretada a intervençã­o federal no Estado do Rio, o governador Luiz Fernando Pezão disse uma frase que poucos ouviram, menos ainda registrara­m e, como todas de sua autoria, não ficará para a história: “Eu vou sair. Já saí”. Referia-se ao governo do Estado, significan­do talvez que, sob intervençã­o, sua presença se tornará irrelevant­e. Modéstia de Pezão —a dúvida não se refere a ele ficar ou sair, mas sobre se, um dia, terá entrado.

Para os de fora do Rio, que só conhecem Pezão de nome, eis alguns dados. Foi prefeito de Piraí, simpática cidade de 28.222 habitantes perto de Volta Redonda, da qual Sérgio Cabral o alçou em 2007 para ser seu secretário de Obras e, em 2010, vice-governador. Com a renúncia de Cabral em 2014, Pezão assumiu o posto e, pouco depois, foi eleito ele próprio. Como era impossível trabalhar com Cabral sem ser respingado, Pezão também tem problemas com a Lava Jato. Seu mandato, por exemplo, está cassado e ele governa por liminar.

Mas Pezão não é Sérgio Cabral. Rega-bofes parisiense­s com guardanapo­s na cabeça, hotéis de luxo, joias, relógios e ternos de grife não são com ele. Talvez mande fazer sapatos sob medida, mas você também mandaria se calçasse 48. E o mote da campanha que o elegeu em 2014 foi apresentá-lo, não como administra­dor, mas —acredite— como filho amantíssim­o.

Então, o que Pezão foi fazer no Palácio Guanabara? O mesmo que Dilma Rousseff no Planalto —esquentar o banquinho. Assim como Lula elegeu Dilma para guardar seu lugar, Cabral elegeu Pezão, não porque quisesse voltar ao governo do Estado, mas para conservar seu poder na máquina do PMDB no Rio quando alçasse voos mais altos.

A mosca azul mordeu Dilma e ela puxou o tapete de Lula. Já Cabral sabia que Pezão tinha a casca grossa, à prova de moscas. ANTONIO DELFIM NETTO ideias.consult@uol.com.br

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