O filme da sua vida
PARECIA UM voo normal, como outro qualquer. Foi tudo bem até o meio da viagem. De repente, vi uma fumaça saindo de uma das turbinas. O avião começou a tremer e a perder altitude. Aconteceu então uma despressurização da cabine e as máscaras de oxigênio caíram automaticamente sobre nossas cabeças. Seguindo à risca as instruções dos comissários de bordo, primeiro coloquei minha máscara sobre o nariz e a boca, ajustei o elástico, e comecei a respirar normalmente. Só então fui ajudar as crianças ou pessoas incapazes que estavam perto de mim. Por acaso, estavam ao meu lado o prefeito do Rio e o prefeito de São Paulo. Apesar de viajarem muito, eles não tinham noção do que fazer. Depois de auxiliar os dois a usar suas máscaras, fui percebendo que o problema era realmente grave. O avião continuava caindo.
Como geralmente acontece nessas horas, minha vida começou a passar diante de meus olhos, como se fosse um filme. Mas o equipamento de entretenimento da aeronave avisou, logo no texto de abertura: “O filme da sua vida foi adaptado para este formato de tela e teve sua duração e conteúdo modificados para exibição neste sistema”. Logo depois, apareceram as logomarcas do estúdio produtor do filme, da produtora associada e das empresas que deram apoio cultural:“Junk Pictures apresenta, em associação com Santa Filomena Produções Cinematográficas, e com o apoio cultural dos Postos de Gasolina Saturno... O Filme da Sua Vida!”. Enquanto isso, o avião continuava perdendo altitude. Na telinha do encosto da poltrona começaram a aparecer imagens de um parto, feitas com o maior bom gosto, sem muito sangue, e com uma iluminação que criava um clima poético. Nesse momento, o piloto avisou que faria um pouso de emergência. E fez realmente uma aterrissagem heroica, aplaudida por todos os passageiros encagaçados.
O pouso foi num pequeno aeroporto de uma ilha vulcânica, no Oceano Pacífico. A companhia aérea instalou os passageiros num filme da minha vida.