Modelo de negócios de Mark Zuckerberg é mesmo ‘desleal’?
FOLHA
Não tenho nada contra ou a favor do Facebook. Não conheço a empresa e atualizo muito pouco a minha página na rede. Praticamente todas as (poucas) vezes em que me aventurei a discutir qualquer coisa na rede foram frustrantes.
Posts rápidos, feitos no calor da hora, são um péssimo veículo para qualquer argumentação lógica e ponderada. Não tenho nenhum dado para saber se, no somatório de prós e contras, a existência do Facebook piorou ou melhorou a qualidade da democracia. Possivelmente nunca se saberá.
O que se percebe é que a rede faz muita gente perder um tempo infinito bisbilhotando a vida dos outros e postando fotos e mais fotos de gatinhos, netinhos e churrascos na praia.
Dito isso, acho uma grande bobagem a onda que se formou, nos últimos tempos, de atacar a empresa em razão de seu “modelo de negócio” de seus “algoritmos” e da difusão incontrolada de fake news.
Quanto às fake news, vamos ser claros: o Facebook não tem nenhuma responsabilidade sobre o tema. A rede social é simplesmente uma plataforma na qual milhões de pessoas disponibilizam informações a seus amigos —e são elas as responsáveis pela falsidade ou veracidade da informação.
Se uma vovó posta a foto de um gatinho falso na rede e você compartilha, a culpa —definitivamente— não é de Mark Zuckerberg.
Alguém aí acha que a fake news criada pela comissão do Senado, garantindo não existir deficit na Previdência Social, é de responsabilidade da instituição Congresso Nacional? A comparação pode não ser perfeita, mas toca no ponto central: são os amantes que produzem fake news, não o sofá da sala.
Quanto ao modelo de negócio, o tema é bastante simples: o Facebook é uma empresa privada, não uma ONG global. Eugênio Bucci, amigo e jornalista pelo qual tenho grande admiração, chama a empresa de “conglomerado que fatura montanhas de dólares explorando multidões escravizadas”. Não concordo. Não há ninguém escravizado pelo Facebook.
Se as pessoas entram lá e colocam seus desabafos e fotos sem camisa, é simplesmente porque imaginam estar ganhando alguma coisa em troca. Percebem algum valor gerado pela rede. Promovem ideias ou exibem o novo corte de cabelo, não importa. Valor é uma medida subjetiva e intransferível. Não há nenhuma deslealdade no modelo e nenhum tipo de violência envolvida.
A mais: não há nenhum problema com a montanha de dólares recebida pela empresa. Isso só mostra a montanha de valor que ela gera. Se os ventos mudarem e a concorrência se tornar mais eficiente, a montanha vai rapidamente se transformar em um baldinho de areia. ALGORITMOS Sobre os algoritmos, vejo por aí muito barulho e (quase) nenhuma informação objetiva. Vamos supor que seja verdade que alguma equação maquiavélica, guardada a sete chaves na gaveta de Zuckerberg, em Menlo Park, efetivamente favoreça o contato de cada usuário com pessoas ou ideias mais próximas de seu perfil.
Vamos lá: pessoas que têm histórico de gostar de literatura receberiam mais informação sobre livros, em vez de reality shows. O sistema faria desaparecer conteúdos com os quais não nos identificamos. Ok, isso não parece lá muito pluralista. Mas não é exatamente o que as pessoas fazem o tempo todo, deletando os amigos que divergem de suas posições políticas, religiosas ou morais?
Seria mesmo a rede a responsável pela “tribalização” ou é nossa própria cabeça que tende a funcionar de um modo tribal?
Penso que faz falta, em nosso debate público, uma compreensão mais adequada sobre como funciona essa grande máquina processadora de escolhas individuais que é o mercado.
Se alguém não estiver satisfeito com os termos do negócio proposto por Zuckerberg, ou qualquer outro, basta dar alguns cliques e sair da rede. Simples assim. A carta de alforria já vem assinada no ato da compra. FERNANDO SCHULER