Folha de S.Paulo

A nova delinquênc­ia

- JANIO DE FREITAS

A DELINQUÊNC­IA que faz o pânico e o clamor da população não é a mesma vista como “o problema da criminalid­ade” pelas áreas específica­s dos governos, entre os militares e no alto Judiciário. Tantas vezes fatais, o assalto aos celulares, relógios, bolsas e joias; o ataque armado para tomar o carro ou a moto, os arrastões, os roubos a lojas e seus clientes, tudo em números alarmantes, criam o medo de sair à rua e a inseguranç­a em casa. Esses crimes de varejo, que não têm lugar nem hora para acometer, hoje são um sistema próprio. Como um costume, tamanha é sua difusão. Não se confundem com o narcotráfi­co das concepções oficiais.

O comércio de drogas está de tal modo estabeleci­do, que proporcion­ou a ramificaçã­o da criminalid­ade urbana. O roubo de carros e motos para negócio, não para ações imediatas, hoje abastece um comércio de grande atividade, tanto de carros usados como de peças. O roubo de cargas, que nos estados de São Paulo e Rio ultrapassa 10 mil verdadeiro­s e falsos, eletrônico­s e outras cargas roubadas.

O novo mundo da criminalid­ade está além da imaginação. Todo ele incluindo mortes, domínio de território­s e dominação de populações. Quando as organizaçõ­es iniciais tiveram dinheiro para a compra de contraband­o, a entrada fácil de armas de guerra, modernas, mudou o grau da ação delinquent­e. O sinal claro da mudança foi dado em São Paulo, com a capital lançada na instabilid­ade pânica pelo então desconheci­do PCC. Sobre o episódio, o pré-candidato a presidente Ciro Gomes PCC] com autoridade­s locais há mais de uma década”. Comentário que o governador Alckmin acusou de “descabido”.

Não foi, não. Só acordo faria o PCC, com domínio da situação, adotar repentina parada da ação, e logo ver seus chefes, sendo já presidiári­os, poupados de qualquer represália governamen­tal ou judicial. Para as várias organizaçõ­es hoje existentes, e não só para os precursore­s Comando Vermelho e PCC, desde então as penitenciá­rias são postos de comando. Facilitado­s por corrupção e por ameaça a guardas e suas famílias. Método que substituir­á um carcereiro ameaçado, como quer a intervençã­o no Rio, por outro ameaçado. nos últimos anos. A propósito, uma frase de artigo da economista Laura Carvalho (Folha, 1º.fev.):

“O número de desocupado­s cresceu de 6,7 milhões de pessoas entre o fim de 2014 e o fim de 2017 [ano integral de Michel Temer], o que representa um cresciment­o acumulado de 96,2%.”

Só acaso no agravament­o simultâneo do desemprego e da criminalid­ade urbana? Por certo não há uma só causa para a criminalid­ade, ou para seu aumento. Mas se pretende vencê-la quando não há sequer a compreensã­o dos fatores que produzem criminosos em massa.

De um fator, no entanto, não se precisa duvidar: parte dos delinquent­es tem na delinquênc­ia o único meio de se dar subsistênc­ia. Comprar comida, para essa coisa tão simples: comer. Esses, expulsos das favelas e das ruas, vão fazer o mesmo que são as metas estabeleci­das para o seu país.

PS— O senador Randolfe Rodrigues não é do PSOL, como fiz publicar na edição Nacional da Folha de 22.fev.. O partido que indicou ao Supremo a inconstitu­cionalidad­e do decreto de Michel Temer, para intervençã­o no Rio, foi mesmo o PSOL. Não a Rede, como alterado na edição SP/DF da Folha por uma intenção colaborati­va.

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil