Com ‘emoticons’, escola de SP incentiva alunos a externarem sentimentos
Painéis de emoções já resultaram em intervenções em casos de bullying; intervenções são planejadas a partir de resultado
É de maneira inusitada que começam as atividades do dia dos cerca de 500 alunos do Educandário Dom Duarte, no Jardim Esmeralda, zona oeste de São Paulo: os estudantes colocam, em um painel ao lado da lousa, emoticons usados na internet para externar seu estado de espírito e disposição para assistir às aulas.
Com base no resultado demonstrado pelo “painel das emoções” —se a maioria começou o dia triste, alegre, irritada, nervosa, tranquila etc— o professor pode mudar a estratégia programada, alterando conteúdos ou metodologia, ou ainda propor intervenções individuais.
“O painel funciona como um termômetro para o educador. Mesmo aquela criança que tem colocado com frequência a carinha de alegre, é preciso prestar atenção e fazer alguma investigação, pois ela pode estar disfarçando um problema”, afirma Marina Diniz Nambu, supervisora de projetos sociais do educandário, mantido pela organização Liga Solidária.
A adesão à iniciativa é voluntária, mas acabou virando prática entre os alunos da escola. Para os menores, colocar seu emoticon é motivo de euforia. Os adolescentes resistiram mais, mas acabaram se convencendo de que a prática poderia ser positiva.
A dinâmica do painel permite que um mesmo estudante troque seu humor durante as aulas. Quando há algum conflito entre alunos, eles são estimulados a colocar seu sentimento novamente no quadro e, depois, abrir uma discussão sobre ele.
“Muitas vezes, crianças e adolescente entram em conflito por não conseguirem identificar seus sentimentos. Um pode não estar com raiva do outro quando começa uma briga, mas, sim, estar trazendo à tona uma situação vivida em casa. O que fazemos é abrir um espaço para discutir isso”, diz Nambu.
O painel das emoções está inserido em um projeto maior de trabalhar a “cultura de paz” dentro da escola, o que envolve atividades pedagógicas, culturais e esportivas.
De acordo com a psicóloga Elaine Di Sarno, especialista em terapia cognitivo-comportamental pela USP, crianças trazem junto com sua história insatisfações e rebaixamento de autoestima e vão acreditando que são indesejáveis e incompetentes.
“Essa autoimagem negativa se projeta em ações de violência contra o outro e até contra si. O professor precisará proporcionar situações de verbalização de suas tensões por meio de desenho, escrita, jogos, leitura etc.” BULLYING Casos práticos de intervenção nas famílias quando o aluno tem se expressado rotineiramente triste ou nervoso, por exemplo, já acontece- ram e tiveram resultados positivos, segundo a escola.
Também já foram detectadas, por meio do uso do painel, ocorrências de bullying e de violência doméstica.
A partir da constatação, a escola pode programar atividades como palestras, dinâmicas e realização de trabalhos em grupo para que os alunos aprendam e reflitam ao expor as emoções.
Para a professora de educação infantil Márcia Carmo da Silva, 36, a dinâmica deu tão certo que os próprios alunos já cobram discussões. “Eles pedem a abertura de diálogo quando o painel marca um resultado muito chamativo, com muitos apontando a mesma emoção”, diz.
Para a psicóloga Di Sarno, “se desde cedo os alunos reconhecem o que sentem, ganham autonomia para agir em situações de conflito, aprendem a estabelecer relações de reciprocidade, de cooperação e de rivalidade, desenvolvendo sociabilidade e reduzindo sua vulnerabilidade”.