Folha de S.Paulo

Apaixonado­s e racionais

- TOSTÃO

EM 1968, 50 anos atrás, Chico Buarque escreveu a peça Roda Viva. Foi o ano também do Álbum Branco, dos Beatles, do assassinat­o de Martin Luther King, de grandes protestos pelo mundo, do famigerado AI-5, imposto pela ditadura brasileira, da invasão da Tchecoslov­áquia pela URSS, dos Jogos Olímpicos do México e de tantos outros fatos marcantes da história.

Em 1968, também se jogava futebol. O Cruzeiro foi tetracampe­ão mineiro, época em que os estaduais eram os campeonato­s mais importante­s. A seleção, sem Pelé, que viajava pelo mundo com o Santos, fez uma longa excursão por vários continente­s. A estreia foi contra a Alemanha. Perdemos por 2 a 1. Poderia ter sido 4 a 1 ou mesmo 7 a 1.

O Brasil repetiu o sistema tático do fracasso de 1966, com apenas dois no meio-campo e quatro na frente, com enormes espaços entre os setores. Nas copas de 1958 e 1962, vencidas pelo Brasil, houve uma variação Rivellino fez o mesmo em 1970.

No dia seguinte à derrota para a Alemanha, eu, Gérson e Rivellino decidimos mudar o sistema tático, sem avisar o técnico Aymoré Moreira, campeão do mundo em 1962. Formamos um trio no meio, com Gérson, mais recuado e centraliza­do, eu, pela direita, e Rivellino, pela esquerda. Demos um show, e Aymoré foi bastante elogiado. Nas outras partidas, atuamos da mesma maneira, com bons resultados e atuações. portuguesa. Uma multidão não saía do hotel e corria atrás do ônibus da seleção, gritando: “Pelé, Pelé”! Não sabiam da ausência do Rei. Os empresário­s não devem ter dito, para vender mais ingressos. No jogo, o estádio estava vazio. O ingresso era muito caro. Os pobres africanos não viram a partida nem Pelé.

O mundo e o futebol se transforma­ram nos últimos 50 anos. Muitos por estruturas coletivas modernas, dos clubes e da atual seleção.

Vi muitos times e seleções excepciona­is, mas poucos foram os revolucion­ários, que influencia­ram a maneira de jogar de um país e do mundo.

A seleção inglesa de 1966 foi a primeira a formar duas linhas de quatro e dois atacantes, sistema cada dia mais atual, com muita velocidade e intensidad­e para a época. A brasileira de 1970, pelo talento individual e por ser o primeiro time brasileiro a defender e a atacar com muitos jogadores. A holandesa de 1974, o início da marcação por pressão por todo o campo, sem posições fixas. O Barcelona, dirigido por brilham os craques. Os dois conceitos se completam. Talento individual e coletivo precisam andar juntos. O mesmo deveria ocorrer na sociedade. Temos de buscar nossos desejos individuai­s, com respeito às regras e necessidad­es coletivas. Somos apaixonado­s e racionais, ambiciosos e solidários. Somos humanos.

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