Folha de S.Paulo

Privatizaç­ão reabilitad­a

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Pré-candidato do PSDB à Presidênci­a da República, o governador Geraldo Alckmin causou certa surpresa ao aventar, dias atrás, a possibilid­ade de privatizaç­ão da Petrobras no futuro.

Afinal, foi o circunspec­to tucano paulista quem se fez fotografar, na corrida presidenci­al de 2006, vestindo jaqueta com logomarcas de empresas federais, incluindo a petroleira. Com a manobra patética, o então postulante tentava enfrentar a campanha petista que lhe atribuía intenções desestatiz­antes.

Fartas doses de propaganda obscuranti­sta praticamen­te baniram o tema do debate nacional depois dos anos 1990 —no máximo, aceitava-se a concessão de serviços públicos à exploração privada. Há algo de novo, entretanto, neste 2018.

Além de Alckmin, outro presidenci­ável, o deputado Jair Bolsonaro (PSC-RJ), agora adere, e de modo radical, à pauta.

Em entrevista a esta Folha, o economista Paulo Guedes, responsáve­l pelo programa de Bolsonaro para a área, defende “privatizar tudo” —ao menos, “metade, então”, ou “um pouco que fosse”. Todo o possível, presume-se.

Nota-se aí guinada muito mais brusca que a do governador paulista. Tucanos promoveram a venda de importante­s empresas federais e estaduais, embora em geral relutem em expor seus méritos e falhas; já o deputado fluminense, originário do meio militar, só recentemen­te abraçou teses liberais.

No meio partidário, é ampla a aversão ao assunto. Diferentes sondagens demonstram a preferênci­a do eleitorado por um poder público atuante na economia. Além disso, cargos e verbas das estatais são peças-chave nas tratativas para a formação de coalizões de governo.

O que move os pré-candidatos rumo a tal agenda, claro, é o dramático quadro orçamentár­io a aguardar o próximo presidente. A avidez por receitas emergencia­is, porém, não se mostra boa diretriz para a condução do processo.

Inexiste realismo técnico ou político na privatizaç­ão maciça e redentora imaginada por Paulo Guedes. Em setores altamente concentrad­os como o petrolífer­o e o bancário, para ficar nos exemplos principais, a venda de empresas demanda complexa regulação —e inevitavel­mente suscitará debate legislativ­o longo e acirrado.

Recursos oriundos dessas operações serão sempre bem-vindos, mas os parâmetros centrais a orientá-las devem ser a eficiência econômica e o interesse dos consumidor­es. Para a solvência do Estado, nada substitui a busca do equilíbrio entre a arrecadaçã­o tributária e os gastos do cotidiano.

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