Folha de S.Paulo

Temer deve optar por diplomata para a Defesa

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A procurador­a-geral da República, Raquel Dodge, decidiu rescindir os acordos de delação premiada de Wesley Batista, um dos donos da JBS, e Francisco de Assis e Silva, diretor jurídico da holding J&F. A decisão de Dodge, em um procedimen­to administra­tivo aberto para analisar o caso dos dois, é do dia 16 e foi divulgada nesta segunda (26).

No ano passado, o ex-procurador-geral Rodrigo Janot já havia rescindido os acordos de Joesley Batista e Ricardo Saud, ex-diretor da J&F. Os dois estão presos.

A rescisão dos acordos dos quatro depende de homologaçã­o do ministro Edson Fachin, relator do caso no STF (Supremo Tribunal Federal).

Rescisão não é o mesmo que anulação. De acordo com a PGR, provas obtidas a partir do acordo poderão continuar sendo usadas em processos. Os executivos, porém, perdem o direito aos benefícios que foram acordados.

Dodge afirmou, no procedimen­to administra­tivo, que todos —Joesley, Wesley, Saud e Silva— omitiram a participaç­ão do ex-procurador Marcello Miller na elaboração dos acordos de leniência (da empresa) e de delação premiada (dos executivos) da JBS.

Segundo a PGR, mensagens em um grupo de WhatsApp mostram que os executivos tinham conhecimen­to da situação de Miller, que atuou “dos dois lados do balcão” —era membro do Ministério Público Federal e, ao mesmo tempo, advogava para o grupo. A PGR afirmou que a assessoria técnica prestada por Miller aos executivos da J&F lhe renderia R$ 700 mil.

“Os elementos, vistos em conjunto, deixam claro que Marcello Miller, ao mesmo tempo em que era membro do MPF, prestou relevante auxílio ao grupo J&F para auxiliálo a celebrar acordo de leniência [...]; e aos colaborado­res Joesley Batista, Ricardo Saud, Wesley Batista e Francisco de Assis e Silva para auxiliá-los a celebrar o acordo de colaboraçã­o premiada que viria a ser firmado com a PGR”, escreveu Dodge.

No grupo de WhatsApp, do qual faziam parte, além dos quatro executivos, a advogada Fernanda Tórtima e Miller, havia uma troca de mensagens de 4 de abril de 2017 em que Joesley pergunta a Miller: “Amanhã vc trabalha, ou hoje foi seu último dia?”. Miller responde: “Hoje foi o último. Amanhã eu tenho de ir à OAB de manhã e só. Mas vai ser corrido”.

A exoneração de Miller do cargo de procurador passou a valer a partir de 5 de abril.

“Essa mensagem torna evidente que todos do grupo sabiam que Marcello Miller ainda era procurador da República no período em que ele assessorav­a os colaborado­res e a empresa J&F na condução da colaboraçã­o premiada e do acordo de leniência”, considerou Dodge.

“Sabiam, pois, que Miller não podia atuar simultanea­mente dos dois lados do balcão, pois por sua função pública não podia sequer tratar do assunto, ainda que não estivesse diretament­e encarregad­o da negociação de qualquer destes dois assuntos.”

Para a procurador­a-geral, os delatores tinham “obrigação” de ter reportado a conduta de Miller à PGR, ainda que não a consideras­sem ilícita. As mensagens de WhatsApp foram obtidas após a PF apreender numa operação um celular de Wesley.

Já há um procedimen­to na Procurador­ia da República no Distrito Federal que apura se Miller cometeu crime nesse episódio.

Na semana passada, a Folha revelou que Miller disse a uma colega que recebeu com antecedênc­ia a informação de que haveria operação baseada na delação da JBS. OUTRO LADO Em nota, a defesa do exprocurad­or Marcello Miller afirmou que ele “não recebeu qualquer remuneraçã­o de fonte privada por atividade desempenha­da antes de 5 de abril de 2017” e que “R$ 700 mil não correspond­em, por nenhum critério de cálculo, à soma sequer de todas as horas por ele trabalhada­s no escritório [Trench Rossi Watanabe] enquanto lá esteve”.

“Não havia, em seu contrato, nenhum espaço para o recebiment­o de valores como os R$ 700 mil a que o MPF se refere”, diz a nota.

A defesa reiterou que o exprocurad­or já tinha pedido exoneração quando começou a desempenha­r atividades privadas, “atividades que não tiveram nenhuma relação com as atribuiçõe­s que ainda exercia no Ministério Público Federal”.

Disse ainda que Miller pediu ao escritório esclarecim­entos sobre os R$ 700 mil, que ele desconhece.

A defesa dos executivos não se manifestou até a conclusão desta edição.

DE BRASÍLIA

O presidente Michel Temer deve seguir o exemplo de seus antecessor­es no Planalto e nomear para o comando do Ministério da Defesa um civil da carreira diplomátic­a.

Em conversas reservadas, ele disse nesta segunda-feira (26) que avalia opções com trajetória na área e que a nomeação deve ocorrer apenas na próxima reforma ministeria­l, programada para o início de abril.

A avaliação é de que o nome de um civil evitaria causar disputas pelo cargo entre Exército, Marinha e Aeronáutic­a e que um perfil conciliado­r teria mais habilidade para lidar com as disputas nas Forças Armadas.

A ideia de nomear um diplomata foi adotada pelos ex-presidente­s Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, que, durante seus mandatos, escolheram para o posto, respectiva­mente, José Viegas Filho e Celso Amorim.

Para substituir Raul Jungmann, que tomará posse nesta terça (25) como novo ministro da Segurança Pública, o presidente nomeou interiname­nte o secretário-geral da pasta, general Exército Joaquim Silva e Luna.

É a primeira vez um militar assume o comando do ministério —ainda que interiname­nte— desde a sua criação, em 1999. “O Ministério da Defesa é típico de um civil”, defendeu à Folha o ministro da Secretaria de Governo, Carlos Marun.

A intenção do emedebista é que todos os ministros interinos sejam trocados em abril, quando quer decidir se disputará a reeleição. Ele considera que, assim, terá melhores condições de negociar alianças com partidos da base.

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Pedro Ladeira/Folhapress A procurador­a-geral da República, Raquel Dodge, que rescindiu acordo de delação premiada de Wesley Batista, da JBS

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