Folha de S.Paulo

Zerar o jogo

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BRASÍLIA - Escalado por Michel Temer no comando da Polícia Federal para controlar a Lava Jato, o delegado Fernando Segovia se transformo­u, nos últimos 110 dias, em um risco que precisava ser eliminado.

O presidente, que esperava estancar a sangria no momento em que a operação se aproximava dele de maneira crítica, percebeu que as declaraçõe­s desavergon­hadas do diretor da PF em sua defesa começavam a provocar o efeito contrário.

As inúmeras tentativas de Segovia de desmerecer o trabalho de investigad­ores que confrontav­am Temer produziram um ambiente de hostilidad­e e provocaram reações enérgicas na Polícia Federal, na Procurador­ia-Geral da República e no STF.

O governo passou a enxergar, por exemplo, uma ameaça de insurgênci­a dos agentes da PF que cuidam do principal inquérito que envolve Temer, suspeito de favorecer empresas que atuam no porto de Santos.

Dias depois de Segovia indicar publicamen­te que esse caso deveria ser arquivado e que os investigad­ores poderiam ser punidos, o delegado responsáve­l pediu a prorrogaçã­o de um inquérito que o próprio Temer esperava ver enterrado rapidament­e.

As trapalhada­s de Segovia foram tão absurdas que o ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo, interpelou o diretor da PF, e a procurador­ageral da República, Raquel Dodge, chegou a pedir que ele fosse proibido de falar sobre o assunto.

Para o Planalto, o empenho exagerado de Segovia na missão de proteger o chefe pode ter ampliado o rigor com que essas três instituiçõ­es vão investigar, processar e julgar Temer —em uma batalha que jamais poderia ser vencida pelo presidente.

A demissão de Segovia é uma tentativa de “zerar o jogo”, nas palavras de um auxiliar do governo. Seu substituto é considerad­o pelo Planalto mais comedido. A demissão do delegado foi uma maneira de se livrar de um vilão atabalhoad­o que revela aos espectador­es seu plano infalível antes de derrotar os adversário­s.

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