Folha de S.Paulo

Policiais reclamam de clima de instabilid­ade

Presidente de associação de delegados ressalta possíveis mudanças em toda a cadeia de comando da Polícia Federal

- RUBENS VALENTE

Chefe de entidade de peritos diz que gestão Segovia teve pontos positivos, como debate sobre reestrutur­ação

A segunda substituiç­ão no comando da Polícia Federal em apenas 110 dias causou preocupaçã­o entre policiais federais pela instabilid­ade no órgão. Eles preveem uma terceira troca até o fim do ano, caso Temer não consiga se reeleger ou eleger um sucessor.

Fernando Segovia assumiu o cargo em 20 de novembro passado e foi substituíd­o nesta terça-feira (27) por decisão do novo ministro extraordin­ário da Segurança Pública, Raul Jungmann.

Para Edvandir Paiva, presidente da ADPF (Associação dos Delegados da Polícia Federal), a principal repercussã­o entre os policiais é a sensação de instabilid­ade na corporação. Quando um diretorger­al assume, tem por hábito substituir os responsáve­is pelas seis diretorias que formam o comando da PF.

Como efeito em cadeia, superinten­dentes regionais podem ser substituíd­os para acomodar aliados do novo diretor-geral de forma a alinhar os gestores do segundo escalão com o comando em Brasília.

“A instabilid­ade, para a instituiçã­o, é muito ruim. Eu acho que precisamos ter previsibil­idade, não passar por tantas alterações. Essas mudanças são muito prejudicia­is para uma Polícia Federal que tem tantos trabalhos em andamento”, disse o presidente da ADPF.

Paiva afirmou que suas críticas não se dirigem a Galloro, que é considerad­o um delegado capaz, está na PF desde 1995 e desempenho­u diversas funções no órgão, mas sim às “constantes trocas”. Para ele, a instabilid­ade administra­tiva poderá afetar os diversos inquéritos mais sensíveis e que demandam mais gastos.

Segundo Paiva, o episódio reforça a necessidad­e da adoção, pelo Palácio do Planal- to, de duas bandeiras históricas da ADPF: a escolha do nome do diretor-geral a partir de uma lista tríplice, na qual todos os delegados votariam, a exemplo do que ocorre há anos na escolha do chefe da Procurador­ia-Geral da República, e a criação de um mandato de dois ou três anos para o cargo.

Em maio de 2016, quando surgiram rumores de que o então diretor-geral, Leandro Daiello, deixaria o cargo, a ADPF entregou ao governo o resultado de consulta aos de- legados. Erika Marena, que por mais de dois anos atuou na Lava Jato, recebeu 1.065 votos, seguida por Rodrigo Teixeira (924) e Marcelo Freitas (685). Marena foi recentemen­te nomeada superinten­dente da PF em Sergipe. O governo Temer resolveu não seguir a lista, nomeando Segovia.

O presidente da APCF (Associação Nacional dos Peritos Criminais Federais), Marcos Camargo, disse que a curta gestão de Segovia foi tumultuada, mas houve iniciativa­s positivas, cuja sequên- cia agora entra em xeque. “No momento em que estávamos melhorando o clima interno, ocorrer uma mudança como essa vai gerar instabilid­ade interna”, disse.

Poucos dias depois de tomar posse no cargo, Segovia autorizou uma ampla discussão interna para reestrutur­ação de cargos na PF, com participaç­ão de sindicatos e associaçõe­s não apenas de delegados, mas dos outros cargos, como peritos, agentes, escrivães e papiloscop­istas.

Embora alvo de críticas, a proposta de reestrutur­ação era vista por policiais federais como uma oportunida­de de modernizar práticas administra­tivas e melhorar a relação entre os ocupantes dos diversos cargos.

Flávio Werneck, presidente do Sindipol (Sindicato dos Policiais Federais) no Distrito Federal, disse que uma troca na direção-geral “sempre preocupa porque a continuida­de da administra­ção é importante”. “Sempre que troca a direção, troca toda a espinha dorsal do departamen­to. Então, é bem problemáti­co nesse sentido”, disse. Por outro lado, segundo o sindicalis­ta, a nova gestão tem oportunida­de de manter pontos positivos da gestão de Segovia, como “a retomada do diálogo e a tentativa de saneamento de problemas internos”.

Em nota, a Fenapef (Federação Nacional dos Policiais Federais) procurou um discurso de apoio ao novo diretor, afirmando ter recebido “com naturalida­de a troca de comando”. “A entidade também manifesta que, assim como Fernando Segovia, Rogério Galloro terá total apoio dos policiais federais para ocupar a função.”

“Na avaliação da entidade, diversos acontecime­ntos contribuír­am para um desgaste da gestão de Segovia. O então diretor assumiu a pasta em um momento de crise política. Na segurança pública, teve de enfrentar a resistênci­a dos próprios pares e, recentemen­te, fez declaraçõe­s conturbada­s sobre o trabalho de investigaç­ão desempenha­do pela Polícia Federal”, diz a nota.

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Ueslei Marcelino/Reuters Fernando Segovia, que deixou comando da PF, durante posse de Jungmann à frente do Ministério da Segurança Pública

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