Folha de S.Paulo

Desacordo entre Tesouro e Minas Gerais vai ao STF

Governo tenta bloquear R$ 6 bi, e Estado mineiro consegue liminar a seu favor

- CAROLINA LINHARES

União alega que não recebeu no prazo documentaç­ão prevista na renegociaç­ão de dívidas dos Estados

Um desentendi­mento entre o governo de Minas Gerais e a Secretaria do Tesouro Nacional em torno da renegociaç­ão da dívida levou Estado e União de volta a uma discussão judicial.

Alegando a ausência de documentaç­ão prevista no acordo de renegociaç­ão de dívidas estaduais, o governo federal pediu, na sexta-feira (23), que o Banco do Brasil bloqueasse cerca de R$ 6 bilhões de recursos mineiros, como receitas tributária­s e repasses do FPE (Fundo de Participaç­ão dos Estados e do Distrito Federal). Obteve, porém, apenas R$ 122 milhões.

Minas enfrenta grave crise fiscal. Tem parcelado o salário dos servidores. Diante da ação do Tesouro, alega ser alvo de “intervençã­o financeira” (leia entrevista ao lado).

De acordo com a secretária do Tesouro Nacional, Ana Paula Vescovi, o governo mineiro perdeu prazos para apresentar aditivos ao contrato que estabelece a renegociaç­ão das dívidas da União com o Estado.

O governo mineiro, porém, diz ter enviado todas a documentaç­ão a tempo e recorreu ao STF (Supremo Tribunal Federal), que suspendeu, nesta terça-feira (27), o bloqueio solicitado pelo Tesouro.

A ministra Rosa Weber concedeu uma decisão liminar (provisória) para que a União se abstenha de cobrar os R$ 6 bilhões. Também determinou a devolução do montante de R$ 122 que haviam sido transferid­os para o governo federal.

“A União não apenas reteve os repasses constituci­onalmente garantidos como apropriou-se de valores de propriedad­e do Estado. A conduta da União [...] representa irrefutáve­l prejuízo aos serviços públicos essenciais no âmbito de Minas, mormente nas áreas da saúde e segurança públicas em prejuízo a vidas humanas”, diz a AdvocaciaG­eral de Minas Gerais. ACORDO A lei complement­ar 156, sancionada em dezembro de 2016, estabelece­u um plano de auxílio aos Estados, com alongament­o do prazo de pagamento da dívida com entes da União. Essa lei prevê a suspensão do pagamento da dívida pelos Estados por seis meses e retorno gradual da quitação ao longo de outros 18 meses, que terminam em julho deste ano.

Antes de aderir à renegociaç­ão da dívida, Minas Gerais movia uma ação judicial no STF a respeito do montante, mas desistiu do processo conforme exige a lei que regulament­ou o socorro da União.

Segundo a Advocacia-Geral de Minas Gerais, o Tesouro deu prazo de 60 dias, a partir do dia 23, para regulariza­r a entrega de documentos que ainda estariam faltando, mas, no mesmo dia, determinou o bloqueio dos recursos. O Tesouro afirma, contudo, que o Estado foi avisado desde o ano passado sobre a questão da documentaç­ão.

Segundo o Tesouro, como Minas desistiu do processo anterior sobre a dívida e já não tinha proteção judicial, bem como não apresentou a documentaç­ão prevista, tornou-se obrigatóri­a a cobrança do valor da dívida que estava suspenso.

De julho de 2016 a fevereiro de 2018, o Estado pagou R$ 2,9 bilhões em dívidas com a União —e não R$ 9,5 bilhões que seriam devidos sem o acordo. O Tesouro bloqueou a diferença. Folha - Por que houve o bloqueio de R$ 6 bilhões em recursos de Minas Gerais?

Odair Cunha - Tínhamos uma [decisão] liminar que suspendia o pagamento da dívida à União. E o governo federal propôs uma acordo de renegociaç­ão da dívida dos Estados. Só que teríamos de abrir mão da ação para aderir. E, sem a liminar, o Tesouro passou a cobrar essa dívida?

De maneira sorrateira, covarde e irresponsá­vel, eles bloquearam recursos do Estado. Infelizmen­te, tivemos de recorrer novamente ao Judiciário para que a União não aja de maneira ardilosa com os mineiros. O Tesouro afirma que faltam documentos de Minas para aderir à renegociaç­ão da dívida.

Contestamo­s a informação de que não entregamos todos os documentos. Tudo foi entregue a tempo e a hora. E eles nos deram prazo de 60 dias para completar a documentaç­ão. Não obstante, já fizeram o confisco. Veja como é arbitrária e sórdida a ação do Ministério da Fazenda. Minas está em crise financeira. O que tem sido feito?

Estamos fazendo tudo que está à altura do Estado para reequilibr­ar as contas sem que haja diminuição de recursos em áreas essenciais.

Estamos percebendo no governo federal um esforço gigantesco para que nós façamos a adesão ao programa de recuperaçã­o fiscal mais amplo, o que significar­ia venda da Cemig, da Copasa e da Codemig.

Apesar de todo o cerco econômico, financeiro e político que o governo Temer faz sobre o Estado, nós temos mantido os índices de criminalid­ade em queda. Em que se constitui esse cerco?

O cerco está na diminuição de repasses para a área da saúde. Há um estrangula­mento em razão da PEC do Teto. Ou quando eles tentam inviabiliz­ar a renovação da concessão das usinas da Cemig. Há uma ação orquestrad­a por parte do governo Temer no sentido de que nós vendamos o controle das empresas de Minas.

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Ana Paula Vescovi, secretária do Tesouro Nacional, para quem Estado de MG perdeu prazo para entregar documentos

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