Folha de S.Paulo

Medidas extraordin­árias

- COLUNISTAS DESTA SEMANA segunda: Leão Serva; ILONA SZABÓ DE CARVALHO terça: Vera Iaconelli; quarta: Ilona Szabó de Carvalho; quinta: Sérgio Rodrigues; sexta: Tati Bernardi; sábado: Oscar Vilhena Vieira; domingo: Antonio Prata

A INTERVENÇíO federal na segurança pública do Estado do Rio de Janeiro é o capítulo mais extremo da crise que afeta diversas unidades da federação há décadas. Não é de hoje que as Forças Armadas são chamadas para apagar incêndios. Nos últimos dez anos, o Exército participou de 67 operações de Garantia da Lei e da Ordem (GLO) país afora. Na GLO, os militares atuam de forma provisória com poder de polícia até o restabelec­imento da normalidad­e, em área restrita e por tempo limitado. A eficácia dessas ações tem sido contestada dado o seu alto custo e efeito de curta duração.

Já a intervençã­o é uma medida de exceção máxima que está sendo usada pela primeira vez desde a Constituiç­ão de 1988. Durante sua vigência de dez meses, as polícias Civil e Militar, os Bombeiros e o sistema penitenciá­rio do Rio ficarão sob a responsabi­lidade direta de um intervento­r, um general do Exército, mas há uma diferença fundamenta­l a ser observada. Se a intervençã­o falhar, não há outra medida constituci­onal prevista sem que haja restrições de liberdades.

Como sabido pelos mandatário­s, o tema tem o apoio das ruas: 75% dos moradores do Rio de Janeiro acham que a segurança pública deve melhorar com a intervençã­o federal no Estado. Mas já sabem que o buraco é mais embaixo: 81% avaliam que a medida não vai resolver Ideia Big Data. Outros Estados cogitam pedir uma intervençã­o e o presidente da República já afirma que o sucesso do Rio será aplicado em outros lugares por meio do recémcriad­o Ministério Extraordin­ário da Segurança Pública. Há (muitas) controvérs­ias nessa declaração.

Pelo que está em jogo, vidas de cidadãos brasileiro­s, a intervençã­o não pode falhar. Seu foco principal precisa ser a reestrutur­ação das instituiçõ­es de segurança pública do Rio e o enfrentame­nto da corrupção policial em parceria com o Ministério Público, o Judiciário e a Polícia Federal. A coordenaçã­o dos esforços será crucial sistemas de informação das duas polícias, sistema prisional e Exército.

Exemplos de reformas policiais em outros países têm no uso de dados elemento fundamenta­l para otimizar o trabalho das polícias, permitindo a melhor identifica­ção dos problemas, e gerando indicadore­s para montar um sistema de responsabi­lização. Essa realidade não está tão distante do Rio, onde o Sistema Integrado de Metas foi implementa­do em 2009, inspirado no CompStat de Nova Iorque, e é uma ferramenta gerencial fundamenta­l para integrar o trabalho das polícias e checar a efetividad­e das ações. Também no Rio, o Instituto de Segurança Pública possui corpo técnico qualificad­o e capaz de liderar um esforço de integração de dados e de fomento a uma cultura de policiamen­to com base em evidências científica­s melhorar a segurança pública precisamos ir além das medidas extraordin­árias. Precisamos de uma vez por todas de uma política e de um plano nacional de segurança pública baseados em evidências, com visão de longo prazo, competênci­as definidas e recursos assegurado­s, como temos na saúde e na educação. Essa mensagem não dá voto, mas salva vidas.

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