Folha de S.Paulo

Escolas, armas e cidadania

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Desde o dia 14 de fevereiro, quando um jovem abriu fogo numa escola, matando 17 jovens e deixando vários feridos, num episódio recorrente na história recente dos Estados Unidos, as reações já conhecidas vêm ocorrendo: os jornais escreveram editoriais sérios a respeito, políticos disseram que algo deve ser feito para controlar o acesso às armas e alguns chegaram a dizer que não aceitarão mais doações da NRA (a toda-poderosa associação de produtores de rifles).

Algo novo, no entanto, emergiu e não veio de políticos e nem sequer de outros adultos. Os alunos se mobilizara­m e partiram para o Capitólio, confrontar­am os políticos, deixando clara sua posição contra a facilidade com que pessoas com problemas mentais compram armas, entre as quais as de assalto ou de guerra, como a utilizada.

Vários usaram as redes sociais ou blogs e criaram, junto a suas comunidade­s, reais ou virtuais, encontros em que repetiam: “Chega de armas”.

Mobilizaçõ­es de estudantes acabaram ocorrendo em todo o país e alguns secretário­s de educação chegaram a ameaçar de suspensão quem se manifestas­se, o que levou universida­des de ponta a publicarem cartas em que assumem o compromiss­o de desconside­rar, no processo de admissão de alunos, suspensões vinculadas ao movimento estudantil.

Algo de diferente vem, de fato, ocorrendo com esses jovens que, frente à impotência dos adultos em criar um ambiente protegido para o aprendizad­o e um futuro mais pacífico, resolveram sair do banco de trás e ser protagonis­tas na luta por um país melhor. Nesses dias, a despeito de todo o sofrimento, eles aprenderam como nunca.

De fato, aprender guarda forte relação com transforma­r a realidade. Aprendemos mais quando somos solicitado­s a resolver problemas reais de nossa comunidade e, num processo colaborati­vo, servimo-nos dos conceitos que nos foram ensinados para enfrentá-los. Dessa maneira também nos transforma­mos, como bem coloca Michael Fullan em sua recente obra, “Deep Learning” (aprendizag­em profunda, em português), sobre experiênci­as educaciona­is em redes públicas de sete países.

Daí porque é tão importante educar para valores e atitudes, como estabeleci­do nos Objetivos de Desenvolvi­mento Sustentáve­l para 2030 e, em especial, para o protagonis­mo dos jovens alunos. Aprender que somos responsáve­is pela nossa própria aprendizag­em e pela construção de nosso futuro faz muito sentido e forma para a independên­cia.

Mais interessan­te ainda é o fato de que, ao fazê-lo, desenvolve­mos as chamadas competênci­as para o século 21, solução de problemas, trabalho colaborati­vo, empatia e persistênc­ia que irão nos preparar para uma sociedade incerta e em contínua transforma­ção.

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