Folha de S.Paulo

‘Levanta os braços. E os seios’, diz agente da revista íntima

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DA ENVIADA A BRASÍLIA

As visitas fazem fila em um corredor para passar pela revista íntima antes de entrar no presídio da Papuda.

Todas de branco, calçando sandálias modelo havaianas, como exige o complexo penitenciá­rio, as mulheres esperavam pacienteme­nte pela sua vez na sexta-feira (2).

Na parede estavam fixadas as orientaçõe­s, numa folha de papel: são proibidas roupas insinuante­s e transparen­tes, calças skinny e sutiãs que não sejam os tradiciona­is.

A porta se abre. Agentes jovens, de camisetas pretas e luvas (algumas usam máscaras que cobrem boca e nariz) indicam o lugar da revista.

A sala é pequena, com vários boxes, como se fossem provadores de lojas femininas —mas sem cortinas.

Cada uma em seu lugar, todas tiram as roupas.

Uma agente se posiciona na frente da visita e orienta: “Levanta os braços. Agora os seios. Vira de costas. Dobra o chinelo. Abre bem a boca”.

Tudo certo, ela se despede. “Bom dia. Boa visita.” E a entrada é permitida. Não é simples chegar ao Complexo Penitenciá­rio da Papuda, nos arredores de Brasília, para quem não tem como ir de carro.

Dependendo da localidade, a viagem em transporte público pode demorar até mais de duas horas e sair por R$ 30 a ida e a volta.

Resultado: a maioria dos visitantes que se aglomerava­m no galpão de entrada no dia em que visitei Maluf eram de classe média.

“Muito preso mais pobre nem sempre recebe visita”, me explicou já dentro da cadeia o ex-senador Luiz Estevão, que lá cumpre pena.

Cada visitante pega uma senha antecipada e precisa passar no guichê para mostrar os documentos. A pessoa então recebe outro papel com nova senha e código de barras. O processo pode demorar quase duas horas.

As mulheres são maioria, numa proporção de quatro delas para cada homem.

Quase todos carregam sacos transparen­tes —regra do presídio— com as coisas que vão levar ao preso.

Eles podem receber no máximo seis frutas, de apenas quatro tipos: banana, goiaba, maçã e pera.

Jesse Ribeiro comprou para Maluf duas unidades de cada fruta, menos goiaba.

Os cartazes avisam: é possível levar ainda 500 gramas de biscoitos sem recheio, dois sabonetes “de cor branca”, dois rolos de papel higiênico “de cor branca”, um creme dental “de cor branca”, um desodorant­e bastão roll-on, um sabão em barra “de cor branca” e 500 gramas de sabão em pó “em saco plástico transparen­te”.

Roupas e calçados “apenas decorbranc­a”tambémpode­m ser entregues aos detentos, alémdeselo­s,envelopese“três fotografia­s10x15cm(semconteúd­o pornográfi­co”).

Familiares e amigos conversam e às vezes, de tanto se encontrar na entrada da Papuda, até ficam íntimos.

Mulheres de camisetas rosas com a inscrição “Grupo Presídio”, da Igreja Universal do Reino de Deus, abordam as visitas. Com caderno e caneta, anotam seus nomes e endereços e se oferecem para uma tarde de orações.

Tentam ainda dar conselhos. “Mãe, você tem autoridade. Não importa o que o seu filho fez. Nem a dor que você sente. Você tem que dizer a ele ‘é a última vez que te visito neste lugar’”.

Advogados espalham seus cartões nos bancos para fazer propaganda. “N Advocacia Resolve”, dizia um deles, com telefone e endereço.

Uma senhora já conhecida de todos montou uma espécie de chapelaria no lugar.

Ela guarda os aparelhos de celular e carregador­es das pessoas em saquinhos numerados. Na volta, devolve em troca de algum trocado.

Aproveita ainda para vender café e roupas brancas para aqueles que fazem a visita pelaprimei­ravezenãos­abem direito as regras do lugar.

E um outro cartaz informa os preços da cantina: as canetas esferográf­icas custam R$ 0,50, os biscoitos, R$ 1,50, um repelente sai por R$ 7 e um sabonete por R$ 1.

Ainda na espera, muitos recebem mensagens e torpedos no celular com recados de outros familiares aos presos.

Pouco antes de entrar para ver o ex-prefeito, Jesse lê uma mensagem de WhatsApp de Otavio, o filho mais velho de Paulo Maluf: “Manda um beijo pro papai”.

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