Folha de S.Paulo

Um Janot diferente

- JANIO DE FREITAS

COM O tempo, sucedem-se constataçõ­es de atos de Rodrigo Janot, quando procurador-geral da República, distantes da fundamenta­ção minimament­e necessária. Ou da segurança argumentat­iva esperável do status dos denunciado­s e da responsabi­lidade do denunciant­e. Os dois casos agora conhecidos tiveram, nas ocasiões das respectiva­s denúncias, repercussã­o robusta e influência em vários inquéritos. Isso os faz mais graves.

No primeiro, o que a procurador­ageral Raquel Dodge fez, e o ministro Edson Fachin subscreveu, foi desmanchar a confusão conceitual do seu antecessor —por provável falta de reflexão, para nem falar em máfé— entre responsabi­lização judicial e investigaç­ão. Livre da primeira, como presidente imune a responsabi­lização por ato anterior ao mandato, Michel Temer ficou excluído por Janot também da investigaç­ão de um ato posto sob inquérito. e Cláudio Mello Filho para acerto de um aporte da empreiteir­a, por fim fixado em R$ 10 milhões. Desfeita a equivalênc­ia imprópria, Temer está agora sujeito à investigaç­ão, ficando a eventual responsabi­lização judicial para depois do mandato. As doações convertera­m-se em bombas contra o sistema político, e a inocentaçã­o prévia e incabível de um ocupante da e um erro compromete­dor.

Em sentido inverso, no segundo caso Janot fez contra Dilma Rousseff uma denúncia que, por falta de fundamenta­ção, teve seu arquivamen­to pedido por Ivan Marx, procurador da República no Distrito Federal, com possível investigaç­ão futura. O então procurador-geral denunciou Dilma por obstrução de justiça, em alegados emails de advertênci­a aos marqueteir­os Mônica Moura e João Santana sobre seus riscos na Lava Jato. Sem investigaç­ão alguma, só a quebra de sigilo telefônico e de emails foi dada como insuficien­te

Esse caso, do período já final de Janot na PGR, põe outros em dúvida. Corrobora o comentário de Temer sobre a denúncia de última hora para tirá-lo do governo: “É um amontoado de acusações só para fazer a denúncia”. Era mesmo, com mais ênfase do que fundamenta­ção, também por falta de investigaç­ão. E assim facilitou que a Câmara mandasse a denúncia para o arquivo. Ou para o lixo.

O ministro Edson Fachin já recusou várias sentenças curitibana­s que ecoavam denúncias originária­s de Janot ou, também curitibana­s, com endosso seu. Por alguma razão, não fazem notícia. LIMPEZA Quem considera que grupos criminosos infestaram a PM, a ponto de ser pedida a prisão simultânea de 96 integrante­s de um batalhão, já pôde ver que tentativas internas e da Justiça não conseguira­m reverter essa realidade. Afora as próprias polícias, no entanto, os estados não dispõem de outra força potencialm­ente capaz de enfrentar a infestação. A única existente são as Forças Armadas.

Nessa tentativa pode estar uma tarefa que, por si, justifique a intervençã­o. Mas só o resultado o dirá, e toda previsão será leviana.

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