Folha de S.Paulo

Melhora da economia tira empresas da desoneraçã­o

Com alta de receitas, regime que alivia folha de pagamento fica desvantajo­so

- MARIANA CARNEIRO

Desde o pico, 60% saíram do programa; tendência diminui previsão de ganho do governo com reoneração

Pouco a pouco, mais empresas estão abandonand­o, por livre e espontânea vontade, a desoneraçã­o da folha de pagamento. O impulso está sendo dado pela recuperaçã­o da economia.

Desde 2014, ano de pico de ingressos no regime tributário, o número de participan­tes caiu a menos da metade. Dos cerca de 84 mil que estavam na desoneraçã­o em outubro daquele ano, hoje são 34 mil, uma redução de 60%.

Lançado em 2011, no governo Dilma Rousseff, o programa visa a reduzir os custos de produção de setores que empregam muita gente, permitindo que as empresas deixem de recolher os 20% da contribuiç­ão previdenci­ária sobre a folha de pagamento. Em troca, passam a pagar um percentual do faturament­o, que varia de 1% a 4,5%.

Em 2016, após o governo elevar as alíquotas, muitas empresas deixaram o regime, que passou a ser opcional para 56 setores selecionad­os, entre os quais têxtil, calçadista, de construção e comunicaçã­o (como jornais e TVs).

Em 2017, o êxodo prosseguiu, com menos intensidad­e, porém mais empresas decidiram abandonar o programa.Emumano,maisde7.000 empresas deixaram o regime.

Para os economista­s José Roberto Afonso e Vilma da Conceição Pinto, do Ibre/FGV (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas),omotordesa­ídaagora é diferente.

Se antes o abandono da desoneraçã­o foi motivado por uma inadequaçã­o ao regime tributário —uma empresa que emprega pouca gente, por exemplo—, agora a saída ocorre pelo aumento da receita, em razão da recuperaçã­o da economia.

“A evasão em 2017 decorreu mais por parte de empresas que, mesmo com a alta da alíquota,nãoveemvan­tagens em razão das mudanças econômicas recentes”, diz Vilma.

O fato de as empresas terem passado a faturar mais com a melhora da economia torna a desoneraçã­o desvantajo­sa, pois a tributação incide sobre a receita. Acaba valendo a pena voltar a recolher a tributação previdenci­ária.

Fernando Abras, diretor da Cia do Jeans, afirma que a empresa ficou pouco mais de um ano no regime e decidiu sair.

No setor de confecções, do qual faz parte, é comum a terceiriza­ção de partes da produção —assim, a folha de pagamento própria é menor. Dessa maneira, mais vantajosa é a tributação sobre a folha do que sobre o faturament­o.

A Cia do Jeans, que fabrica a Wrangler, emprega 380 pessoas diretament­e e 800 terceiriza­das em Colatina, no Espírito Santo.

Caso o governo leve adiante o enxugament­o do regime tributário, como tenta desde 2017, será indiferent­e para o empresário, assim como para boa parte do setor de confecções, em sua avaliação.

“Os que mais se beneficiar­am foram os fabricante­s de tecidos,nãoasconfe­cções.No nosso setor, há muita microempre­sa e outras grandes que são só gestoras de marca, não têm funcionári­os próprios.” QUEM SOFRE Os dados mais recentes sobre os participan­tes do regime de desoneraçã­o da folha são de outubro de 2017 e foram apresentad­os pela Receita Federal a pedido da Folha.

É possível notar que, com a redução do número de empresas aderentes, a renúncia fiscal do governo com o programa também está caindo.

De janeiro a outubro de 2014, a perda de arrecadaçã­o foi de R$ 16 bilhões. No mesmo período do ano passado, o valor caiu para R$ 9,7 bilhões.

A consequênc­ia mais grave é a redução dos ganhos com uma eventual reversão da política de desoneraçã­o, como deseja o governo.

No ano passado, a equipe econômica informou que esperavare­colherR$8,8bilhões neste ano com o fim do programa para mais de 50 setores.Acifraestá­sendorecal­culada —está em R$ 7 bilhões—, mas deve ficar ainda menor.

Um indício já aparece nas contas do Tesouro Nacional.

Quando desonerou as empresas, o governo se compromete­u a ressarcir a Previdênci­a.Ouseja,alémdeabri­rmão de receita, o governo ampliou despesas com o programa.

A economia esperada pelo governo é a soma dos dois: redução das despesas com a compensaçã­oeoaumento­das receitas com a reoneração.

Mas, no ano passado, os gastos com a compensaçã­o caíram 24% ante 2016, segundo cálculos da IFI (Instituiçã­o Fiscal Independen­te). Na virada de 2015 para 2016, a despesa havia recuado 35%.

Paraoecono­mistaFábio­Pina, da Fecomercio­SP, a possibilid­ade de as empresas optarem por ficar ou sair (a escolha é feita uma vez por ano) é a melhor parte do programa.

A reversão significar­á um aumento do imposto para os que, em cálculos próprios, gastam muito com folha e, por isso, preferem pagar sobre fatia do faturament­o.

Heitor Klein, presidente da Abicalçado­s (que reúne os calçadista­s), diz que a melhor saída é manter os grandes empregador­es, para os quais a política foi desenhada. Renúncia estimada pela Receita Federal, em R$ milhões 2011 O governo decidiu substituir a contribuiç­ão previdenci­ária equivalent­e a 20% sobre a folha de pagamentos por alíquota que variava de 1% a 2%, de acordo com o setor

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