Estar prontas até 2020.
DA ENVIADA AO AMAZONAS
O bodó é conhecido pelos amazonenses por ser um peixe muito resistente, capaz de respirar fora d’água e “viver na lama”. Por habitar áreas alagadas,inspirouonomepejorativo dado às favelas de palafita no estado: “bodozal”. Assim como o peixe, para viver nessas regiões de Manaus é preciso ser resistente.
Ali, milhares de pessoas passammesesemcasasdepalafita inundadas de água suja duranteoperíododasenchentes, entre abril e junho. “A cheiaaquisobedevagaredesce devagar. Ficamos no mínimo 70 ou 80 dias acima da cota de emergência do Rio Negro”, explica o secretário-executivo da Defesa Civil de Manaus, Cláudio Belém.
Para se preparar, amazonenses fazem as marombas — um estrado de madeira, apoiado no chão da casa, que funciona como um piso elevado de cerca de um metro. Como as casas são baixas, moradores ficam espremidos entre a maromba e o telhado.
“Temos que andar ajoelhadosouagachadosemcasapor mais de dois meses. E a água fede, fede, fede! Os bichos sobem pelas brechas da madeira,ficapodre,éinsuportável”, diz a comerciante Lidiane da Silva, 38, que paga cerca de R$ 300 para fazer a maromba.
Segundo a Defesa Civil, Manaus tem 28 mil residências em área de risco. Ao longo de décadas, populações mais pobres se instalaram na beira dos 148 igarapés que cortam o município.
Lidiane mora na beira do Igarapé do Quarenta, entre os bairros Raíz e Betânia, a cerca de 4 km do centro, em uma das regiões mais afetadas pelas cheias em Manaus. A comunidade, como muitas favelasdepalafita,édominadapelotráficoechamadapelosmoradores de “área vermelha”.
A poucos metros dali, as paredes da casa da cabeleireira Daniele Machado, 36, estão cheias de “furos de fuzil”. Ela mora com a filha de 12 anos na casa de uma amiga, porque a sua tombou na última enchente. Daniele prefere sair do bairro e ficar com parentes durante a cheia do que fazer maromba.
“Aqui não tem saneamento, então a água entra em casa com toda a porcaria: cocô, xixi de rato, tudo”, diz. Na época das enchentes, segundo a Defesa Civil municipal, aumentam os casos de hepatite, leptospirose, febre tifóide, diarreia crônica, dengue e parasitoses intestinais.
Segundo pesquisa do Instituto Igarapé a partir de dados oficiais, o Amazonas é o estado com o maior número de deslocados por desastres naturais, 840.252, desde 2000. No total, 84% dos desabrigados e desalojados foram afetados por inundações. Manaus aparece como a 6º cidade do país com mais deslocados no período: 59.756.
Boa parte dos atingidos por inundações em Manaus mora nos chamados “bodozais”. Nessasfavelas,ascasasdepalafita ficam apoiadas umas nas outras, lado a lado, formandocorredoresestreitos.O colorido das paredes e roupas nos varais contrasta com o cheiro forte de lixo, esgoto e fezes de animais. As casas costumam ter canos para fora, que servem para jogar os dejetos diretamente na lama. É esse líquido escuro que invade as casas nas enchentes.
A prefeitura de Manaus diz que o município está menos vulnerável a enchentes e que intensificou ações de dragagens de igarapés e drenagens. A administração destaca o plano preventivo que antecipa serviços em áreas críticas.
“A Operação Cheia 2018 já teve início, com a retirada de lixo da orla do rio Negro, limpeza e dragagem de igarapés, cadastramento de famílias em situações vulneráveis e construção de pontes em áreas de alagações”, disse, por meio de nota.
Já o governo do estado afirma que acelerou os processos para a conclusão do Programa Social e Ambiental dos Igarapés de Manaus (Prosamim) —o projeto retira casas de palafita, constrói conjuntos habitacionais no lugar e faz obras de urbanização e saneamento ao redor de rios. O governo estadual diz que as três fases da ação devem MUDANÇAS CLIMÁTICAS Segundo o pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA), Philip Fearnside, os eventos climáticos extremos no Amazonas aumentaram nos últimos 20 anos e ficaram mais graves recentemente, com inundações e secas recordes.
“Com as mudanças climáticas, a probabilidade de esses eventos extremos ocorrerem é muito maior”, afirma ele, que é ganhador do Prêmio Nobel da Paz junto a outros cientistas do Painel Intergovernamental para Mudanças Climáticas (IPCC).
Fearnside cita ainda os fenômenos El Niño e La Niña, o aquecimento das águas do Atlântico e movimentos de zonas de convergência como motivos para as alterações.
Osecretário-adjuntodaDe-