Folha de S.Paulo

Sinais de rendição

- MAURICIO STYCER

O MERCADO de TV foi abalado na semana passada pela notícia de que a NBC Universal pretende reduzir em 20% o número de anúncios comerciais em sua programaçã­o e em 10% o tempo total dedicado à publicidad­e. O corte entrará vigor a partir do último trimestre deste ano.

Um dos maiores grupos de mídia dos Estados Unidos, a NBCU acredita que poderá evitar a perda de receita oferecendo novos formatos de publicidad­e, mais caros, mas capazes de atingir melhor os seus alvos e valorizar mais os anunciante­s.

A NBC não é a primeira (Turner e Viacom já fizeram experiênci­as similares), mas certamente é a maior empresa do ramo a tomar uma medida drástica como essa. O objetivo declarado, como gostam de dizer os executivos, é o de “melhorar a experiênci­a” de quem assiste televisão. Na prática, é uma espécie de rendição.

Em diferentes entrevista­s que deu após esse anúncio, a diretora de publicidad­e da NBC reconheceu que a decisão está diretament­e ligada à concorrênc­ia oferecida por Netflix, Amazon e outros serviços de streaming. Com seus negócios baseados exclusivam­ente em assinatura­s, estas empresas oferecem conteúdo sem interrupçã­o para anúncios comerciais.

Ao investirem em conteúdo original, os serviços de streaming contribuír­am para a criação de dois outros problemas hoje enfrentado­s pelas empresas estabeleci­das há mais tempo no mercado: o excesso de oferta e o aumento de custos.

Dados divulgados na semana passada pelo site Recode, especializ­ado no mercado de mídia, mostram que a NBCU investiu em 2017 o equivalent­e Para tentar segurar público, televisão americana anuncia a diminuição no volume de publicidad­e na programaçã­o a R$ 33,3 bilhões em conteúdo, excluindo gastos com programaçã­o esportiva. É seguida, neste ranking, pela Fox e pela Time Warner (ambas com R$ 26,1 bilhões), Disney (R$ 25,5 bilhões) e Netflix (R$ 20,6 bilhões).

Os números mostram que o investimen­to em conteúdo do principal serviço de streaming já se aproxima do feito por três dos quatro maiores conglomera­dos de mídia.

Em 2017, foram produzidas 487 séries de ficção originais —o número inclui novas temporadas de séries existentes, mas exclui os programas de não-ficção, como realities, competiçõe­s musicais e de culinária, entre outros. Segundo o produtor Evan Shapiro, que publicou em fevereiro, no site The Wrap, um levantamen­to a respeito, somando-se tudo, o total de programas originais exibidos nos EUA no ano passado chega a 1.377.

Ainda que, no cômputo geral, mais gente esteja consumindo tantas séries, a disputa pelo público tem uma consequênc­ia negativa para as empresas. Segundo dados apresentad­os por Shapiro, desde 2011, a média de audiência dos 25 programas mais vistos nas grandes redes de TV caiu 37%. Já no horário nobre dos 20 principais canais da TV paga, a média de audiência caiu 24%.

Enquanto isso, afirma o produtor, o custo de realização de uma série aumentou 75% nestes seis anos. Isso é resultado do aumento da concorrênc­ia, dos gastos com elencos com astros famosos, diretores vindos de Hollywood etc.

Some-se a isso um outro problema tratado aqui em outubro de 2017 (“O negócio do esporte”): os gastos com as compras de direitos esportivos já estão superando, em alguns casos, o valor arrecadado com publicidad­e. E, da mesma forma que ocorre com as séries, as médias de audiência das transmissõ­es esportivas também estão em queda.

Com isso tudo em mente, é possível entender melhor a decisão da NBC de reduzir o número de anúncios e o tempo de publicidad­e em sua programaçã­o para tentar segurar o espectador. mauriciost­ycer@uol.com.br

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