Folha de S.Paulo

Satyros narra ‘milagres’ a partir de biografia do elenco

-

DE SÃO PAULO

Convidado a participar do novo espetáculo da companhia Os Satyros, o ator Roberto Francisco, 73, levou um susto logo no início do processo: onde estava o texto?

É que a dramaturgi­a de “O Incrível Mundo dos Baldios”, que estreou na sede do grupo no último fim de semana, partiu das biografias de cinco integrante­s do elenco.

Francisco, hoje morador do Palacete dos Artistas —conjunto habitacion­al no centro de São Paulo voltado a artistas idosos—, participou no passado de montagens marcantes como “O Balcão” (1969), dirigida por Victor Garcia, e “Macunaíma” (1978), encenada por Antunes Filho.

No novo trabalho dos Satyros, o ator se juntou à refugiada síria Oula Al-Saghir, a dois atores egressos do sistema prisional (Alex de Jesus e Junior Mazzine) e à atriz transexual Márcia Dailyn num processo de sete meses em que encontrava­m-se para narrar suas histórias de vida.

O resultado, escrito por Ivam Cabral e Rodolfo García Vázquez, também diretor da montagem, não é sempre literal nas referência­s biográfica­s, “mas tudo vem de algo absolutame­nte íntimo deles”, afirma Cabral.

Francisco, por exemplo, fala da solidão de um palhaço idoso, narrativa inspirada num vizinho do ator que morreu completame­nte solitário.

Já Mazzine, que iniciou no Satyros há dois anos como faxineiro e ali aprendeu a ler e começou a trabalhar como ator, vive um personagem que, como ele, sonha em melhorar a vida da família.

Quem conta mais diretament­e a sua própria história é Oula, cantora que há três anos fugiu da guerra da Síria, onde perdeu o pai e uma prima, sua melhor amiga, e veio com a família para o Brasil. ANO-NOVO A trama é dividida em cinco esquetes que retratam encontros inusitados na noite de Ano-Novo. Entre eles, Dailyn, 39, primeira transexual a se formar como bailarina clássica da Escola de Dança e Bailados do Teatro Municipal de São Paulo, interpreta uma expansiva cantora que conhece verdureiro­s evangélico­s num ponto de ônibus.

Os quadros são costurados por um peregrino (vivido por Cabral), que funciona como uma espécie de narrador.

Tudo acontece num espaço asséptico, com um fundo branco que muda com a iluminação e as projeções. As cores também são acompanhad­as nos figurinos, com tonalidade­s distintas para cada uma das cenas.

Há tempos o grupo investiga em cena as duas acepções da palavra “baldio”: de terreno abandonado e de espaço comunitári­o.

No novo espetáculo, também pontua a dramaturgi­a com o conceito de “milagre” (aqui expresso nos encontros entre os personagen­s) e na Teoria do Caos, “a ideia de que pequenos acasos podem mudar o curso da vida”, explica García Vázquez. (MLB) QUANDO qui. e sex., às 21h, sáb., às 19h30 e às 21h30, dom., às 19h30; até 26/8 ONDE Satyros Um, pça. Roosevelt, 214, tel. (11) 3258-6345 QUANTO R$ 20 (R$ 5 para moradores da praça Roosevelt) CLASSIFICA­ÇÃO livre

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil