Folha de S.Paulo

Brasil, circa 2018

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Tentar explicar a um estrangeir­o o que ocorre no Rio é exercício de dar dor no coração. “Mas a cidade não tinha melhorado tanto?”, indagará um gringo padrão, do tipo que acompanha à distância o que acontece naquele tal de Brasil.

Militares na rua, fichamento de morador de favela, assalto dentro de colégio tradiciona­l —isso não é nem “so last year”, remete a décadas que pareciam ter ficado para trás.

Um ramo de serviço conhecido há milênios pelo Homo sapiens, aqui chamado Correios, vive apagão nas duas maiores metrópoles do país.

Esse Brasil de faroeste desconhece a riqueza da geografia. Ele se nota em hotel de área nobre de São Paulo, pois bem ali na porta é possível executar um homem na frente dos hóspedes. Aparece na supostamen­te moderna Campinas, onde um pessoal decide enfiar US$ 5 milhões em espécie dentro de um avião e outro pessoal, aparenteme­nte mais esperto, descobre o plano e invade a pista para levar embora as notas.

O bangue-bangue brazuca mistura sotaques. É do tipo que organiza emboscada mortal em área indígena no interior do Ceará contra líderes de gangue criminosa paulistana.

Já na saúde pública, o desprogres­so leva a leishmanio­se visceral em direção à maior cidade do país, que convive ainda com a febre amarela.

No campo dos costumes, filhas solteiras vão aos tribunais pendurar pensões na Viúva. E à segunda mais alta corte da nação parece normal invadir a casa de alguém por causa do cheiro de maconha.

Esse Judiciário é o mesmo que agora inventa greve contra decisão judicial. Isso num país onde o Executivo não vê problema em esconder a agenda do presidente da República e o Legislativ­o perde a vergonha de falar abertament­e quanto custa cada cabeça de deputado.

Tudo bem que a evolução caminha mesmo aos espasmos, com idas e vindas. Mas que 2018 parece ter nascido no século errado, isso parece. roberto.dias@grupofolha.com.br

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