Folha de S.Paulo

Mesmo sem muito otimismo, é reconhecív­el que o chamado QI de Temer está acima de zero

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EM TEMPOS de Lava Jato, como o ano passado, receber suborno e depositá-lo na própria conta bancária, com o agravante de ser pessoa já em complicaçõ­es, demonstrar­ia um coeficient­e de inteligênc­ia invernoso: abaixo de zero. É, no entanto, o Michel Temer esboçado pela Polícia Federal, no pedido de quebra do sigilo bancário do seu suspeito de emitir um decreto, em 2017, para favorecer empresas operadoras no porto de Santos.

Mesmo sem muito otimismo, é reconhecív­el que o chamado QI de Temer está acima de zero. Além disso, em recente advertênci­a ao país e, portanto, à PF, Moreira Franco dizia na Folha: “Aqui [no Planalto] não tem amador”. Já sabíamos, há muito tempo, que na Presidênci­a o chefe só reuniu profission­ais. Embora às vezes haja erros típicos de amadores, como fez Geddel Vieira Lima. É a interferên­cia do QI. Mas a lembrança de Moreira foi oportuna. o inquérito que apura só um pontinho da longa relação entre Michel Temer e o porto de Santos. A pedida quebra de sigilo, por exemplo, oferece ao investigad­o possibilid­ades equivalent­es às 50 perguntas que recebeu da PF. As quais não eram para ser divulgadas, porque indagavam coisas do tipo “recebeu suborno [ou propina]? Tem ligação com...?” Interrogat­ório para respostas negativas, inocentado­ras, mas figurando como interrogat­ório e investigaç­ão.

A mais do que provável inexistênc­ia de depósitos impróprios no movimento bancário de Temer leva ao mesmo: mais uma vez, nenhum indício de ilegalidad­e. Não por acaso, tão logo divulgada a autorizaçã­o da quebra de sigilo, a Presidênci­a comunicou que os extratos bancários de Temer seriam exibidos aos repórteres.

Um plano combinado? A polícia vive de suspeitas. Na era dos profission­ais, estamos obrigados a viver assim também.

O ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo, indignou-se ao ver divulgada sua autorizaçã­o ao pedido da PF. E deu uma relevância adicional ao caso, com a ordem de públicas sobre inquérito em curso. E, nelas, pelo favorecime­nto ao investigad­o Michel Temer.

Tais atitudes sugerem o quanto os ministros do Supremo poderiam contribuir com o poder que mantêm atrelado ao convencion­al, ao seu comum dia a dia. Nos últimos quatro anos, a Polícia Federal, alguns juízes e procurador­es da República praticaram abusos de poder e outras ilegalidad­es a granel. Por conivência, comodismo no Supremo, em torno de princípios da Constituiç­ão essenciais à permanênci­a da democracia, pequena embora, e do Estado de Direito. O GARI João Doria, há mais de ano na prefeitura, ainda não sabe que quem legisla sobre a PM e a Polícia Civil são os governos estaduais, em âmbito restrito, e o federal, em termos nacionais. A arma da sua tropa são as vassouras.

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