Folha de S.Paulo

Priscila é quase um clichê,

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a imagem da pessoa que passa dificuldad­es, mas não aparenta nenhum rancor.

Não tem o menor problema em contar as dificuldad­es que enfrentou ou se tem alguma mágoa como, por exemplo, de sua mãe, Claudia, jamais ter ido vê-la competir. Se tem, não demonstra.

“Ela diz que não precisa me ver porque todo mundo diz para ela que eu jogo bem a capoeira. Mas quando tem vídeo, mostro para ela.”

Ser uma capoeirist­a completa exige o sacrifício de treinar todos os dias. Ela acorda às 3h40 para trabalhar. É ajudante de serviço de corte em fábrica de roupas íntimas femininas. Seu turno é das 5h40 às 14h15. À noite, faz curso de radiologia, que deve terminar em 2019. No meio disso tudo, entra, de alguma forma, a capoeira.

“Disso [a capoeira] não abro mão. É muito família, as pessoas te entendem, te abraçam de uma maneira que você nem consegue entender o motivo. É meu momento familiar e me dá identidade.”

É uma mentalidad­e de capoeirist­a, esporte em que a exibição, o balé, os saltos, valem mais do que a luta em si. Foi exatamente isso que a atraiu há 23 anos, a dança que os negros faziam para esquecerem da escravidão.

Depois de Salvador, Priscila quer ir para Nova York, onde mora o mestre João Grande, 85, seu ídolo, e passar algumas semanas aprendendo com ele. Repete a frase de Grande que “é semente e nasceu para levar esta arte [da capoeira] para o mundo”.

Começando no Rio. O principal sonho de Priscila é criar uma ONG em Caxias para ensinar a dança da capoeira para crianças de rua. Passar aos outros o que recebeu.

“Assim que conseguir me estabiliza­r, ajudar a família, quero abrir a ONG. Quero mostrar para elas que é possível ter uma vida diferente. Não foi isso o que aconteceu comigo?”.

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