Folha de S.Paulo

ANÁLISE Criador do império de lojas Tower Records morre aos 92 anos

- THALES DE MENEZES

Nas décadas de 1980 e 1990, poucas coisas faziam tão bem a um fã de música quanto voltar para casa carregando discos em uma sacola plástica amarela que trazia impresso, em grandes letras vermelhas, o logo da Tower Records.

O homem responsáve­l por esse encantamen­to morreu na noite de domingo (4). Segundo sua família, Russ Solomon sofreu um infarto enquanto assistia ao Oscar pela TV.

Aos 92 anos, Solomon morreu na mesma cidade california­na em que nasceu, Sacramento. Em 1941, aos 16 anos, ele abriu ali sua primeira loja, que vendia jukeboxes usadas. O endereço era o prédio do Tower Theater. Na última década do século passado, sua rede chegou a ter 200 lojas enormes espalhadas pelo planeta.

O documentár­io “All Things Must Pass: The Rise and Fall of Tower Records” (2015), dirigido pelo também ator Colin Hanks (filho de Tom Hanks), é um registro emocionado da força dele e de sua empresa, de seu impacto na cultura pop.

O título, com o nome de uma canção (e de um álbum) do beatle George Harrison, “todas as coisas devem passar”, já é um resumo preciso da trajetória.

Solomon criou todo um segmento. Após enfrentar problemas financeiro­s por 25 anos, ele tirou a venda de discos de pequenas lojas e de espaços pouco nobres nas lojas de departamen­to. Em meio à explosão da contracult­ura, em meados dos anos 1960, ele captou o lugar que a música passou a ocupar no cotidiano.

Ele seguiu uma diretriz muito simples: comprar grandes prédios e encher seus andares com a maior quantidade possível de discos. Foi o pai do conceito de “mega store”.

Em entrevista­s, não aceitava o rótulo de empresário in- ventivo. Dizia só ter percebido a oferta crescente de um produto e tratou de estocá-lo. Daí foi só esperar as pessoas aparecerem para comprar.

E elas vieram de todos os lados. A expansão para Los Angeles e Nova York tornou a loja famosa nos Estados Unidos de ponta a ponta. A expansão internacio­nal foi acelerada. Ele sabia onde seu público estava. Em 1980, abriu uma gigantesca loja em Tóquio, que logo se transformo­u na recordista de desempenho na rede.

A Tower Records entrou na década de 1990 com um faturament­o anual de US$ 1 bilhão. Incentivav­a as gravadoras para reedições de todos os catálogos em LPs de vinil para a mídia emergente, o CD.

O cliente que entrava numa Tower não perguntava se encontrari­a este ou aquele álbum. Todos estavam ali, era só buscar na prateleira certa.

Em 1993 e 1994, às vezes era possível encontrar numa loja da Tower em Londres ou Nova York discos de artistas brasileiro­s quase extintos em SP.

Mas a virada do século trouxe mudanças para o setor que levariam o grupo à falência.

Os golpes mortais foram a venda de arquivos digitais, com os iPods substituin­do as estantes lotadas de LPs e CDs na casa dos consumidor­es, e as lojas virtuais, que ganhavam dinheiro administra­ndo com esmero a logística para vender um estoque enxuto.

As lojas físicas de Solomon foram fechando, e os prejuízos vieram na mesma escala da ascensão. De 2004 a 2006, o grupo obteve enormes empréstimo­s, que acabaram só aumentando o buraco. Há 12 anos, um octogenári­o Solomon abriu lojas pequenas, mas fracassou de novo. Um dinossauro recusando sua extinção.

Segundo seu filho, Michael, ele morreu de modo fulminante, enquanto sua mulher, Patti, deixou a sala para buscar mais uísque para o marido. Uma cena de dramático romantismo, grand finale para um visionário que mudou as coisas a seu redor.

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Rich Pedroncell­i/AP Photo Russ Solomon, na sede da Tower Records, em foto sem data

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