Folha de S.Paulo

Credibilid­ades em risco

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Deflagrada em março do ano passado, a Operação Carne Fraca produziu alarde imediato, mas em poucos dias ficaram claros os exageros cometidos pela Polícia Federal e a falta de amparo técnico em muitas das suspeitas levantadas contra a produção brasileira de proteína animal.

Por isso, não houve o grande impacto negativo que se temia no mercado e nas exportaçõe­s do país. Após suspensões temporária­s de negócios e pedidos de explicaçõe­s, os estrangeir­os acabaram se dando conta da fragilidad­e do caso e retornaram às compras.

Agora, a PF volta a pôr credibilid­ades em risco —incluindo a sua própria— com a nova fase da operação, batizada de Trapaça. Desta vez, investiga-se apenas o setor de aves e, especifica­mente, a BRF, dona das marcas Sadia e Perdigão.

A gigante de alimentos teria mantido a prática de fraudar laudos e informaçõe­s de produtos para burlar a fiscalizaç­ão. Agora, não há relatos de pagamento de propina a fiscais ou políticos.

A corrupção se daria entre agentes privados —a empresa e cinco laboratóri­os teriam agido para ocultar a presença da bactéria salmonela em amostras do processo industrial. O que existe de mais concreto, por ora, são pressões de representa­ntes da BRF para abafar uma denúncia de manipulaçã­o, oriunda de queixa trabalhist­a.

Nada se mostrou, porém, que evidencie a participaç­ão do comando da empresa. Foram no mínimo duvidosos, nesse sentido, os elementos a sustentar a prisão temporária de um ex-presidente.

Para a companhia, que também passa por uma crise de gestão, o dano de imagem é grande. A perda inicial de valor de mercado chegou a R$ 5 bilhões; arrisca-se a continuida­de dos negócios para os fornecedor­es nas regiões atingidas.

A possibilid­ade de perda de mercados internacio­nais tampouco pode ser desprezada. União Europeia e Hong Kong já pediram explicaçõe­s, e outros países devem fazer o mesmo; investidor­es estrangeir­os ameaçam com processos.

As investigaç­ões parecem pertinente­s e devem continuar. Entretanto a PF, o Ministério Público e a Justiça precisam tratar o caso com menos estardalha­ço e senso mais apurado de proporção.

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