Rússia se nega a dar explicações a Londres sobre ataque a ex-espião
Moscou diz não ter ordenado envenenamento e exige amostra de substância para avaliação
Reino Unido afirma que agente químico usado na ação era soviético; crise entre os países encontra eco na Síria
A crise diplomática entre Reino Unido e Rússia devido ao envenenamento de um exespião russo na Inglaterra escalou nesta terça (13). O Kremlin se recusou a fornecer as explicações exigidas pela premiê Theresa May e chamou o embaixador britânico em Moscou para consultas.
Nos EUA, o presidente Donald Trump afirmou mais cedo que falaria com May sobre o caso à noite, e disse que se “a Rússia ou qualquer outro” for culpado pelo ataque, terá de ser condenado.
May havia dito na segunda que é altamente provável que a Rússia seja responsável pelo envenenamento de Serguei Skripal e de sua filha, Iulia, em Salisbury, na Inglaterra, no último dia 4.
Já o chanceler russo, Serguei Lavrov, disse que as acusações contra a Rússia não fazem sentido e que o país demanda examinar amostras do veneno que Londres diz ter atingido os dois.
Trata-se do agente neurotóxico Novichok (iniciativa, em russo), um dos mais letais de sua categoria, que foi desenvolvido pela antiga União Soviética nos anos 1970.
Lavrov disse que o governo britânico tem obrigação de dar acesso à substância porque ambos os países são signatários da Convenção sobre Armas Químicas.
“Falando sobre boas maneiras, deve-se lembrar que a era de colonialismo é uma coisa do passado há um bom tempo”, afirmou, comentando o ultimato de May para que Moscou explicasse o uso do Novichok até o fim desta terça.
Lavrov disse ainda que as ameaças britânicas não deixarão de ser respondidas.
A polícia reconstituiu na terça o caminho de Skripal e da filha, que estão internados em estado grave, para estabelecer riscos de contaminação por onde passaram até serem achados em um banco de praça em Salisbury.
Skripal era um coronel do GRU (serviço secreto militar) e, durante nove anos, entregou nomes de agentes russos ao MI-6 (serviço secreto estrangeiro britânico). Foi pego e condenado a 13 anos de cadeia, mas acabou perdoado pelo governo e enviado para o Reino Unido em 2010 numa troca de espiões.
Desde então, diferentemente de outro espião russo envenenado na Inglaterra, Alexander Litvinenko , ele vivia teoricamente afastado de atividades de inteligência.
O caso de Litvinenko, que morreu em 2006 após contaminação pelo isótopo radioativo polônio-210, é lembrado pelos britânicos atualmente no intuito de estabelecer um padrão —embora haja diferenças entre os incidentes, já que o de 2006 envolvia alguém que operava contra o Kremlin (que, claro, nega têlo matado).
Na Rússia, o caso Skripal vem sendo tratado com um misto de desdém e preocupação pelas autoridades.
Enquanto o site da Embaixada da Rússia em Londres fez gracinha no Twitter, di- zendo que o país também era culpado pela neve que atingiu as ilhas britânicas na semana passada, em Moscou Lavrov tomava suas medidas.
Houve outros reforços. Nos principais canais estatais russos, a moeda corrente é que se trata de uma armação para desestabilizar a reeleição de Vladimir Putin no próximo domingo. SÍRIA Por fim, a crise encontrou eco na Síria, onde forças russas apoiam desde 2015 o governo do ditador aliado Bashar al-Assad em sua guerra contra rebeldes e a facção Estado Islâmico.
O Estado-Maior das Forças Armadas da Rússia apontou a existência de uma trama para a realização de um ataque com armas químicas na região de Ghouta, base de rebeldes ligados à rede terrorista Al Qaeda, que seria então imputado a Assad.
Como ocorreu em um episódio no ano passado, isso daria margem a um ataque com mísseis dos Estados Unidos contra alvos supostamente ligados a tal ação, provavelmente em distritos da capital, Damasco, controlados pelo regime sírio.
“Haverá resposta” caso soldados russos sejam atingidos no hipotético bombardeio americano, afirmou o general Vasili Gerasimov, adicionando temperatura à cada vez mais intrincada crise internacional.