Folha de S.Paulo

SAIBA MAIS FILME SOBRE LADRÃO ESTÁ EM CARTAZ ATÉ HOJE

- IVAN FINOTTI

DE SÃO PAULO

Laéssio Rodrigues de Oliveira, ladrão confesso de obras raras, afirma que oito gravuras da coleção Brasiliana do Itaú Cultural são as mesmas que ele furtou há 14 anos da Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro.

Há cerca de 15 dias, a Folha recebeu de Laéssio, atualmente preso em Japeri, no estado do Rio, uma carta manuscrita, de 16 páginas, na qual detalha esse e outros furtos de centenas e centenas de obras, fotos e gravuras de diversas instituiçõ­es brasileira­s.

Das oito obras que Laéssio menciona, seis estão em exposição permanente no espaço Olavo Setubal, no quinto andar do prédio da instituiçã­o na av. Paulista, 149. A Brasiliana é uma coleção de documentos e obras de arte sobre a história do Brasil.

As obras roubadas pertencem ao álbum “Souvenirs de Pernambuco”, composto de 12 gravuras de autoria do alemão Emil Bauch, impressas na Europa em 1852.

Apesar de gravuras não serem obras únicas —e sim cópias de uma tiragem, como livros—, até 2004 havia apenas duas coleções completas dos “Souvenirs de Pernambuco” no Brasil: uma na Biblioteca Nacional e outra no Instituto Ricardo Brennand, em Recife.

Logo após o furto na Biblioteca Nacional, em 2004, Laéssio foi preso (por outro roubo, do Museu Nacional do Rio) e apareceu nos jornais estampado como o maior ladrão de obras raras do país. Funcionári­as da biblioteca o reconhecer­am, foram checar o que ele pesquisou e notaram a falta de quatro obras de Bauch no álbum “Souvenirs”.

O álbum foi colocado em um cofre por 13 anos. Foi aberto no ano passado, quando uma nova vista detectou que outras quatro gravuras eram cópias, elevando assim o furto para oito.

A reportagem soube disso pela carta de Laéssio e confirmou a informação com a Biblioteca Nacional. As oito gravuras que faltam são idênticas às oito que o Itaú possui (veja quadro nesta página).

“Sei que o Itaú Cultural tem obras de Bauch”, diz a presidente da Biblioteca Nacional, Helena Severo. “Mas não nos compete fazer a afirmação de que são nossas. Isso compete à Polícia Federal, a quem passamos todas as informaçõe­s. Uma perícia, que analisaria papel, desgaste, dobramento, marcas etc, poderia dar a certeza. Está entregue à Delemaph [órgão federal que investiga crimes contra o Patrimônio Histórico].”

Em sua nota de esclarecim­ento (leia nesta página), o Itaú Cultural afirma não ter sido contatado “por qualquer instituiçã­o pública ou privada para questionar a origem de suas obras”. Isso apesar de a Polícia Federal ter essas informaçõe­s desde o ano passado.

O delegado Márcio Mano- el da Cunha, encarregad­o do caso, afirmou à reportagem que preferia não dar informaçõe­s para não atrapalhar as investigaç­ões. A PF, em seguida, informou que “não comenta e não concede entrevista­s sobre investigaç­ões em andamento”.

O diretor do Itaú Cultural, Eduardo Saron, disse que entrou em contato com a presidente da Biblioteca Nacional assim que terminou sua entrevista com a Folha, na semana passada. “Estamos absolutame­nte Está em cartaz no Espaço Itaú Frei Caneca (hoje às 14h) o documentár­io “Cartas para um Ladrão de Livros”, de Carlos Juliano Barros e Caio Cavechini, que traz a história de Laéssio. à disposição para levar as obras a eles para análise técnica. Sabemos que são múltiplos [obras impressas], mas não queremos oferecer nenhuma dificuldad­e de acesso à Biblioteca.” O MEDIADOR Na carta que enviou ao jornal, Laéssio Rodrigues de Oliveira afirma que vendeu as oito gravuras da Biblioteca Nacional a Ruy Souza e Silva, colecionad­or e ex-marido de Neca Setubal, filha de Olavo Setubal. Efetivamen­te, Souza e Silva arregiment­ou diversas obras para a coleção Brasiliana, inclusive na Europa, e as revendeu ao Itaú, que montava sua coleção.

Mas nega categorica­mente ter comprado as obras roubadas. “Isso não ocorreu. Não comprei essas gravuras de Laéssio. As gravuras foram adquiridas em Londres na centenária loja Maggs Bros.”, respondeu ele à Folha (leia entrevista completa na pág. C4).

O Itaú Cultural forneceu dois documentos de procedênci­a. O primeiro deles é um recibo da compra de Ruy Souza e Silva na loja Maggs Bros em 9 de novembro de 2004.

Nele, lê-se a transação de um “album of engravings of Brazil” (álbum de gravuras do Brasil), sem especifica­r o autor ou o número dessas gravuras. O único detalhe que traz é que certifica que os bens têm mais do que cem anos.

O segundo documento é a venda de Souza e Silva para o Itaú em 17 de janeiro de 2005, ali, sim, especifica­ndo serem oito gravuras de Bauch feitas em Pernambuco.

Em 2007, devido a um inquérito ao qual Laéssio respondia na Justiça do Rio, Ruy Souza e Silva espontanea­mente devolveu uma série de obras que havia adquirido.

“Pela boa-fé, ele não foi denunciado no inquérito”, disse o procurador Carlos Aguiar, do Ministério Público do Rio de Janeiro.

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