Peça projeta a inutilidade da linguagem frente à barbárie
FOLHA
Duas teses apresentam-se em “Nomen”: a inutilidade da linguagem frente à barbárie e a redenção da humanidade possível somente por meio da mulher. A primeira, no entanto, é mais bem desenvolvida que a segunda.
A sinopse do espetáculo sugere um drama pós-apocalíptico. Entre o dilúvio e a guerra, jazem entre escombros um soldado (Dawton Abranches), uma garota (Carolina Erschfeld) e seu pai moribundo, representado por um manequim envolto em sacos de lixo.
A rotina do trio, que se alterna entre a lembrança de outrora e a esperança de dias melhores, só é interrompida por eventuais sombras projetadas nas paredes —referência ao mito da caverna.
A dramaturgia, de Bruno Feldman, não nomeia personagens: usa termos que exigem um contexto, como “ele” e “ela”, e emprega palavras de raro uso coloquial.
Afinal, nesse mundo brutalizado, a linguagem que civiliza já não goza mais de autoridade —ironicamente, “nomen” é “nome” em latim.
No entanto alguns símbolos permanecem indestrutíveis: arquétipos do masculino e do feminino irrompem no palco. A guerra, que só ocorria no mundo exterior, passa a ser travada entre os personagens e seu interior.
Do embate, sai vencedora a figura feminina, potência capaz de criar uma nova ordem simbólica —o título poderia ser relido como “no men”, em inglês, “sem homens”.
A dramaturgia apoia-se na construção de símbolos e na exploração do seu potencial metafórico em detrimento da criação de personagens de traços definidos e de uma narrativa propriamente dita.
Consequentemente, embora aponte para uma crítica da condição feminina, o texto não a expõe com clareza.
A encenação parece furtarse à apreensão total do seu conteúdo e, se o objetivo era tratar da precariedade da linguagem, isso é pertinente.
Em muitas cenas, com o claro objetivo de desorientar o espectador, o diretor e iluminador Alex Araújo mergulha a plateia na escuridão.
Em movimento contrário, iluminação e cenografia revelam, aos poucos, os planos presentes no palco. Estruturas pendentes são, a um só tempo, cenário e pontos de luz pulverizados, que expandem o espaço cênico.
Ainda que a montagem sirva à potencialização da leitura das alegorias e símbolos, texto e direção não buscam fixar significados ou relações para esses elementos, como se retomassem um dos grandes debates da linguística: a natureza arbitrária do signo.
Assim, a tarefa de conferir sentido às imagens suscitadas pela encenação e, portanto, ao espetáculo, é designada ao espectador. QUANDO sex., às 21h30, sáb., às 19h30, dom., às 18h30; até 8/4 (não há sessão em 25 e 30/3) ONDE Sesc Ipiranga, r. Bom Pastor, 822, tel. (11) 3340-2000 QUANTO R$ 6 a R$ 20; 16 anos AVALIAÇÃO bom