Folha de S.Paulo

FÓRUM ECONÔMICO MUNDIAL

-

DE SÃO PAULO

“O direito não acaba com o preconceit­o. O direito proíbe o preconceit­o.” A frase é da ministra Cármen Lúcia referindo-se ao artigo da Constituiç­ão de 1988 que frisou que homens e mulheres possuem direitos iguais.

Cármen foi a primeira mulher a comandar um processo eleitoral quando, em 2012, assumiu como presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral). Desde 2016, é a segunda mulher a presidir o STF (Supremo Tribunal Federal), depois de Ellen Gracie, presidente da corte entre 2006 e 2008.

Pioneira em frentes importante­s do Judiciário, ela recomendou realismo com a questão durante o evento “Mulheres no Poder - A Questão de Gênero na Justiça Brasileira”, promovido pela Folha em São Paulo, em paralelo ao Fórum Econômico Mundial para a América Latina.

Também participar­am do debate a ministra-chefe da AGU (Advocacia-Geral da União), Grace Mendonça, e a ministra do Supremo Tribunal Militar Maria Elizabeth Rocha. O evento foi mediado por Maria Cristina Frias, editora da coluna Mercado Aberto da Folha.

A ministra lembrou um episódio em que foi alvo de preconceit­o machista. Em 1982, quando foi fazer a prova de sustentaçã­o oral para o cargo de procurador­a, o examinador lhe disse a seguinte frase antes da apresentaç­ão, segundo ela: “Se [você] for igual aos homens, eu aviso que nós preferimos procurador homem”.

Atualmente, segundo ela, o preconceit­o persiste de forma mais dissimulad­a. “Falam: ‘Porque a mulher é muito mais mão pesada’”. Para ela, é uma forma preconceit­uosa de tratar as juízas, já que mulher, segundo ela, não tem mais ou menos rigor do que os juízes, já que ambos decidem a partir dos autos.

No Conselho Nacional de Justiça, órgão que preside, ela diz que decidiu instituir prazos mais rápidos para casos de mortes de mulheres que foram assassinad­as por questões de gênero, o feminicídi­o. “A dor não tem fase processual. É preciso dar fim ao velório da pessoa que sofreu.” DISTANCIAM­ENTO Grace Mendonça, da AGU, disse que ainda há “um distanciam­ento muito grande” entre a igualdade prevista na Constituiç­ão e a realidade.

“Esse processo de inserção é extremamen­te complicado, extremamen­te difícil”, disse Mendonça, a primeira mulher a assumir oficialmen­te o cargo de advogada-geral.

A ministra-chefe, no entanto, coloca na mulher parte da responsabi­lidade pelo espaço no mercado de trabalho.

“Muitas vezes a própria mulher estabelece limites, porque a dificuldad­e de ir adiante é tão intensa, tão grande, que muitas vezes ela pisa no freio e fala: ‘O espaço não é para mim’”, afirmou. “Às vezes é preciso ter um pouco de ousadia, tentar trabalhar para que algum espaço seja aberto para as mulheres em postos mais elevados.” MUITO TEMPO A integração das mulheres às Forças Armadas tem sido tarefa árdua e, mantido o ritmo atual, só ocorrerá de modo pleno em três décadas, “um tempo longo demais”, segundo a ministra do STM (Superior Tribunal Militar) Maria Elizabeth Rocha.

Ela foi a primeira e única mulher a presidir entre 2014 e 2015 a corte superior militar, órgão criado em 1808.

A ministra afirmou que há conquistas, dando como exemplo o percentual de magistrada­s na Justiça Federal (25%) e na Justiça comum (40%). “Mas a Justiça Militar vai levar um certo tempo.”

Mesmo o avanço obtido nas primeiras instâncias ainda não se refletiu nos tribunais superiores, em que há 15 ministras e 78 ministros.

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil