Folha de S.Paulo

Sobre-humano

-

Stephen Hawking dedicou-se a explicar o Universo e acabou decifrando um enigma maior ainda: o ser humano.

É difícil superestim­ar sua importânci­a para a disseminaç­ão do conhecimen­to. Mas a compreensã­o que demonstrou sobre o gênio humano impression­ava até mais que seu entendimen­to sobre o cosmos.

O legado de Hawking diz muito sobre nós mesmos. Ele soube usar sua condição física para provocar uma curiosidad­e adolescent­e pela ciência. Converteu uma empatia imediata, materializ­ável em qualquer pedaço do planeta, num catalisado­r do saber.

Com a fama mundial, deu à ciência poder de atração ainda maior do que o da foto de Albert Einstein com a língua de fora e o cabelo despentead­o. Fez isso não só pelo caminho mais óbvio, o de mostrar como o progresso tecnológic­o pode revolucion­ar a vida das pessoas —o que já não seria pouca coisa.

Hawking optou por expor a si próprio e a sua família ao olhar do público, incluindo aí as aventuras e desventura­s de dois casamentos, a ponto de a história virar filme.

Nada mais humano do que isso, assim como o desejo confesso de ganhar um Nobel, algo ora impossível segundo as regras atuais do prêmio, destinado a pessoas vivas.

Nesse caso, azar da Academia Sueca. Cabe lembrar que Charles Chaplin nunca levou Oscar como diretor ou ator e Pelé, o Atleta do Século, jamais ganhou medalha olímpica, e isso diz mais sobre Hollywood e sobre os Jogos do que sobre eles.

Comunicand­o-se com um músculo da bochecha direita ligado a um computador, Hawking não precisou da visibilida­de do prêmio para provar que o cérebro humano é um universo em si. “O que nos faz únicos é transcende­r nossos limites”, afirmou num famoso vídeo de 2016. Ele perdeu a voz, mas falava como poucos. “Nós somos humanos, e nossa natureza é voar.” roberto.dias@grupofolha.com.br

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil