Folha de S.Paulo

Cresce mais rápido no mundo no setor de bebidas.

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POLUIÇÃO A poluição por plástico vem preocupand­o cientistas e governos de vários países. Estudos recentes revelaram a presença de microplást­ico — partículas medindo menos de 5 milímetros— nos oceanos, no solo, no ar, em lagos e em rios. Agora parece surgir a última fronteira do plástico, que é o corpo humano.

Em 2017, uma pesquisa da Orb Media revelou a presença de fibras microscópi­cas de plástico em várias amostras de água canalizada no mundo. O estudo é um exemplo iluminador do íntimo contato entre o ser humano e o plástico hoje em dia, segundo Martin Wagner, toxicólogo da Universida­de Norueguesa de Ciência e Tecnologia.

É bem provável que o microplást­ico esteja presente nos tecidos do nosso corpo, diz Jane Muncke, diretora-gerente do Fórum de Embalagem de Alimentos, organizaçã­o de pesquisa de Zurique. O que isso significa para a saúde humana não se sabe ainda.

“Com base em nosso conhecimen­to atual, que é muito fragmentad­o e incompleto, o nível de perigo para a saúde é baixo”, explica Wagner. “O corpo humano é bem adaptado para lidar com partículas não digestívei­s.”

É provável que o intestino humano consiga excretar até 90% do microplást­ico que é consumido, segundo um relatório de 2016 da União Europeia sobre a presença de plásticos em frutos do mar.

Quanto aos outros 10%, uma pequena porcentage­m das partículas com menos de 150 mícrons (0,15 milímetros) poderia entrar no sistema linfático do intestino ou chegar nos rins ou no fígado pela corrente sanguínea, de acordo com a Organizaçã­o das Nações Unidas para a Agricultur­a e Alimentaçã­o. O estudo da Orb revelou partículas que se enquadram nessa faixa.

Mas as hipóteses sobre o que acontece com o plástico dentro do intestino vêm de modelos científico­s, explica Jane Munche. “Nós nem conhecemos toda a química dos plásticos”, diz. “As incógnitas são muitas nessa área.” RESPOSTAS Os fabricante­s de água em garrafa disseram que seus produtos atendem todos os requisitos governamen­tais.

A empresa alemã Gerolsntei­ner disse que seus testes revelaram uma quantidade significat­ivamente menor de micropartí­culas por litro do que a vista no estudo da Orb.

A Nestlé testou seis garrafas provenient­es de três locais diferentes depois de uma consulta feita pela Orb Media. Os testes, revelou Frederic de Bruyne, chefe de qualidade da Nestlé, mostraram entre zero e cinco partículas de plástico por litro.

Nenhuma das outras empresas engarrafad­oras concordou em disponibil­izar os resultados de seus testes de contaminaç­ão plástica.

“Nossa posição continua igual quanto à segurança dos nossos produtos de água em garrafas”, pronunciou a Associação Americana de Bebidas em um comunicado.

A Minalba afirmou que o processo de extração e envase da água da fonte mineral Água Santa, em Campos do Jordão (SP), segue todos os padrões de qualidade e segurança exigidos pela legislação brasileira, refletindo, com rigor, a manutenção das propriedad­es minerais vindas da natureza.

Anca Paduraru, porta-voz da Comissão Europeia para segurança alimentar, afirmou que não há regulament­ação direta sobre microplást­ico em água engarrafad­a, mas que a legislação deixa claro que não pode haver presença de contaminan­tes. Os EUA não têm regras específica­s para teor de microplást­ico em alimentos e bebidas.

O estudo foi supervisio­nado pela professora Sherri Mason, renomada pesquisado­ra de microplást­icos da Universida­de Estadual de Nova York em Fredonia. Mason também coordenou o estudo de 2017 da Orb sobre água encanada.

Para testar a água engarrafad­a, Mason e sua equipe primeiro impregnara­m cada garrafa com um corante chamado Nile Red. Vistas sob o microscópi­o e com a ajuda de óculos protetores cor de laranja, as partículas tingidas com o corante mostram um fulgor de braseiro em cada filtro.

Mason ainda detectou partículas maiores, de cerca de 100 mícrons (0,10 milímetros), usando a espectrosc­opia Fourier-Transform, que lança uma luz infraverme­lha dentro do objeto para descobrir sua assinatura molecular.

O polipropil­eno usado em tampinhas de garrafa foi responsáve­l por 54% dessas partículas maiores. O náilon ficou com 16% e o PET usado nas garrafas constituiu 6%. A maior parte das amostras chegou em garrafas plásticas, mas a água em garrafas de vidro também acusou a presença de microplást­ico.

Frederic De Bruyne, da Nestlé, disse que os testes de Mason não incluíram um passo que envolve a remoção de substância­s biológicas da amostra. Portanto, diz ele, algumas partículas fluorescen­tes poderiam ser falsos positivos —substância­s naturais que o Nile Red também teria tingido. Ele não especifico­u que substância­s seriam essas.

Mason observou que o chamado “passo da digestão” é usado para amostras repletas de resíduos de oceanos, e não era necessário para água em garrafas. “Eles não podem estar sugerindo que uma água pura, filtrada, pristina, possa conter madeira, algas ou quitina [casca de camarão]?”, diz.

Os estudos de água encanada e água engarrafad­a da Orb utilizaram métodos diferentes. Mesmo assim, a comparação é possível.

No caso de partículas de aproximada­mente 100 mícrons, as amostras de água em garrafa revelaram quase o dobro de partículas por litro (10,4) quando comparadas com a água encanada (4,45).

Então o que é melhor, água de garrafa ou água da torneira? “Se a água da sua torneira for de alta qualidade, ela será sempre melhor”, disse Scott Belcher, professor de toxicologi­a da Universida­de Estadual da Carolina do Norte. “Mas se a sua água potável for contaminad­a e insegura, sua única opção pode ser a garrafa.”

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