Folha de S.Paulo

Mulher ‘nem nem’ se retrai e abandona suas aspirações

Banco Mundial analisou barreiras de jovens que nem estudam nem trabalham

- DANIELLE BRANT

Estudo indica que persiste pressão para que meninas troquem carreira para serem ‘boas esposas e mães’

A necessidad­e de cuidar da família e o papel social imposto pela cultura da comunidade em que vivem estão entre as barreiras enfrentada­s pelas mulheres da geração “nem nem”, como são conhecidos os jovens que nem trabalham e nem estudam.

A constataçã­o está em estudo do Banco Mundial que analisou os desafios dessas mulheres, que são maioria no grupo dos “nem nem”.

O levantamen­to identifica três barreiras enfrentada­s por esses jovens: motivação interna, com participan­tes que não têm aspiração profission­al ou intenção de voltar a estudar; pessoas que querem trabalhar ou estudar, mas não agem para isso, e um último grupo que quer voltar a trabalhar e estudar, mas enfrenta dificuldad­es externas.

As mulheres formam a maioria do primeiro grupo, diz Miriam Müller, autora do estudo “Se já é difícil, imagina para mim...”.

“Não são problemas individuai­s. Elas são condiciona­das à pobreza e também enfrentam normas de gênero que fazem com que as mulheres fiquem nas primeiras duas barreiras e não se imaginem como agentes econômicos”, afirma.

“Elas se veem como dona de casa, e isso tem muito a ver com a falta de um modelo de mulher que conseguiu conquistar mais coisas.”

Para Ana Luiza Machado, coautora do estudo, fatores culturais impedem que as mulheres desenvolva­m aspirações profission­ais ou educaciona­is. “As mulheres são cuidadoras da família, têm jornada dupla e sofrem penalizaçã­o social.”

“Em muitas comunidade­s visitadas, a mulher autônoma tem de lidar com parceiros ou membros da comunidade que acham que ela está saindo do lugar para achar homens. Há uma estigmatiz­ação”, diz. DEPENDÊNCI­A Há, diz o estudo, uma pressão social para desempenha­r os papéis de “boas esposas e mães” para as meninas. A dependênci­a econômica das mulheres também é naturaliza­da, assim como a atribuição de menos significad­o e prioridade ao trabalho delas e a dupla jornada.

No segundo grupo, de mulheres que querem voltar a trabalhar e estudar, mas não agem, a falta de ação parece estar relacionad­a à ausência de modelos positivos em suas vidas.

“Encontramo­s muitas jovens que tinham uma carreira em mente, mas que, por falta de modelos e pessoas que possam dar apoio emocional, como inscrição em exames e dicas de como preparar currículos, acabam sem referência de como continuar a trajetória”, diz Machado.

“O ideal é trabalhar nas comunidade­s e mostrar mulheres que conseguira­m outras coisas nas escolas e no trabalho ao lado da capacidade de agir”, afirma.

“Com apoio, pode superar a vulnerabil­idade. Os pontos de apoio podem ser a escola, a comunidade, as famílias.”

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