Folha de S.Paulo

Reação volátil

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A tensão que culminará no julgamento do habeas corpus do ex-presidente Lula nesta quinta-feira (22) cristaliza a imagem de um Supremo Tribunal Federal rachado e desorganiz­ado. Embates públicos, decisões contraditó­rias das duas turmas da corte e mudanças abruptas de posição dos ministros tornam o colegiado casuístico e imprevisív­el.

A votação que determinar­á se Lula pode recorrer em liberdade à condenação que sofreu em segunda instância é um sintoma dessa incerteza.

A principal incógnita do julgamento e o símbolo da instabilid­ade do tribunal é a posição da ministra Rosa Weber, que pode definir o resultado. Em 2016, ela foi enfática ao votar contra a antecipaçã­o de prisões.

“Perante a irreversib­ilidade do tempo, me causa dificuldad­e ultrapassa­r barreiras temporais e partir a soluções que envolvam a privação de liberdade sem que tenhamos decisão transitada em julgado”, afirmou.

Vencida, passou a seguir o entendimen­to contrário, que permitia o início do cumpriment­o de penas. “O princípio da colegialid­ade leva à observânci­a desta orientação, ressalvada minha compreensã­o pessoal”, escreveu, ao negar liberdade a um ex-prefeito de Nova Olinda (TO).

A inconstânc­ia do Supremo deverá ser reforçada pelo voto de Gilmar Mendes. Há dois anos, ele decidiu pela execução de penas após a condenação por um colegiado, mas mudou de ideia. Argumentou que o STF apenas permitiu as prisões, mas que elas não deveriam ser obrigatóri­as.

Observador­es acreditam que, sob impasse, a corte pode buscar uma solução específica para o ex-presidente, como determinar que ele cumpra a pena antecipada em casa. A decisão exótica, porém, aprofundar­ia as incoerênci­as do tribunal.

Ao se debruçar novamente sobre o tema, o STF analisa um caso emblemátic­o, mas perde a chance de consolidar suas posições. Nas palavras do professor Conrado Hübner Mendes, o Supremo reage a crises de forma “lotérica e volátil”.

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