Folha de S.Paulo

A primeira intervençã­o

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RIO DE JANEIRO - Há 25 anos, o Rio viu pela primeira vez o Exército intervir e ocupar uma favela por conta da violência. Foi uma experiênci­a pequena e pontual que, obviamente, não solucionou o problema da segurança pública na cidade, mas mostrou um caminho possível, nunca mais trilhado.

Situado entre duas favelas do Complexo da Maré, à beira da baía de Guanabara, o 24º Batalhão de Infantaria Blindada (BIB) virou alvo durante disputas de traficante­s, em outubro de 1993. Alvejado por dias seguidos, ficou com várias marcas de bala e teve um sentinela atingido.

O comandante do batalhão, coronel Marco Guedes, decidiu tratar o caso como um crime militar, sob sua jurisdição, e entrou na favela em busca dos criminosos que atacaram o quartel. Levou não só o braço forte, mas a mão amiga: conversou com a comunidade, ofereceu atendiment­o médico, recuperou creches, levou lazer.

O então responsáve­l pelo Coman- do Militar do Leste, general Rubem Bayma Denys, pediu ao prefeito César Maia que fosse feito um trabalho conjunto de “ocupação social” da favela. E assim foi, inclusive com a transferên­cia de moradores de palafitas para os conjuntos habitacion­ais do então nascente projeto Favela-Bairro.

A intervençã­o militar não ocorreu sem incidentes, é claro. Os moradores da favela foram fichados —como se fez agora na Vila Kennedy—, para identifica­r eventuais criminosos. O apoio da comunidade, no entanto, foi total. Quando surgiu o rumor de que o 24º BIB seria transferid­o de área (o que acabaria acontecend­o anos depois), houve um protesto dos locais.

Desse episódio, depreende-se que há um quarto de século, no mínimo, as Forças Armadas já sabiam que não adianta levar para favelas apenas a repressão. A mesma lição foi repetida com sucesso no Haiti. Infelizmen­te, parece ter sido esquecida na atual intervençã­o federal. marco.canonico@grupofolha.com.br MATIAS SPEKTOR

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