Folha de S.Paulo

Supremo ou pequeno

- JANIO DE FREITAS

A DECISÃO do Supremo, esperada hoje, sobre o habeas corpus preventivo contra a prisão antecipada de Lula, projetará reflexos de muitos aspectos em muitas direções. Mas nenhuma apagará as sequelas da divergênci­a, dentro e fora do tribunal, em torno da prisão antes de esgotados os recursos dos réus. Como o Supremo autorizou em contraste com o que lhes assegura da Constituiç­ão.

A divergênci­a contém gravidade por si mesma, tratando-se de questões de liberdade e de justiça (há reparo possível para o preso depois absolvido?). A presidente do Supremo, Cármen Lúcia, deu à divergênci­a um caráter que a agravou: o de combinação de afronta ao Supremo e de enfrentame­nto político. Recente frase sua sintetiza tal visão: “Eu não me submeto à pressão”.

A permissão de prisões já na segunda instância de julgamento e recurso, dada pelo Supremo em 2016, recebeu críticas desde o primeiro momento, de advogados, juristas, conflito com a garantia constituci­onal de que ninguém será considerad­o condenado e preso antes de esgotadas suas possibilid­ades de recurso. É fácil perceber aí uma proteção, não só para o réu, como para a própria Justiça contra deformaçõe­s e erros judiciais.

As críticas foram recebidas com o habitual descaso. Ninguém acha o Supremo mais supremo do que o próprio Supremo. Mais avançados do que as críticas, alguns ministros do tribunal tornaram público o desejo de ver a permissão rediscutid­a. adotou súbita rigidez contra o agendament­o do tema. O ministro Marco Aurélio Mello liberou em dezembro, para julgamento, duas ações sobre a permissão. Ficaram na mesa da presidente. Nos últimos três meses, seu argumento básico para essas atitudes diz que “rediscutir um assunto decidido seria apequenar o Supremo”.

Considerar que divergênci­as, críticas e desejo de rediscutir constituem pressão é bem pouco democrátic­o, de minerva. Da presidente Cármen Lúcia. Como resultado, nada é mais rediscutív­el do que esse casuísmo evidente e compromete­dor.

Se rediscutir uma decisão apequena, é o caso de lembrar que, do Direito Romano, ao que a presidente do Supremo deve aplicar, ela o recebeu de milênios de rediscussã­o e reconsider­ação jurídicas. A Constituiç­ão pela qual o Supremo deve zelar rediscutiu, em 1988, os princípios constituci­onais passados, e hoje tem apenas a idade dos moços que chegam aos 30 anos.

Se o direito é uma ciência, das ciências jurídicas, eis algo que vale não só para o direito: a ideia de revisão está implícita no cumprida” ou “Dane-se mais uma”.

Ao encerrar por aqui, agradeço aos ministros Gilmar Mendes e Luís Roberto Barroso pela violência com que se atacam na sessão plenária do Supremo.

Comprovam que a divergênci­a foi levada, só por casuísmo político, a um ponto que, isso sim, a muitos olhos e ouvidos cidadãos apequena o Supremo.

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil