Folha de S.Paulo

Provável substituto se destacou como governador no sul do país

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O presidente do Peru, Pedro Pablo Kuczynski, 79, apresentou sua renúncia nesta quarta-feira (21), menos de 20 meses após tomar posse.

Em pronunciam­ento em vídeo, ele atribuiu a decisão aos “seguidos obstáculos” colocados pela oposição, que criaram “um clima de ingovernab­ilidade para sua gestão”.

O Congresso deve se reunir para debater a renúncia nesta quinta e, se recusá-la, seguir com a votação de vacância do cargo como previsto. Até a noite de quarta, todas as bancadas rejeitavam a renúncia em favor da remoção.

Se for destituído pelo Congresso em vez de apenas renunciar, PPK, como é conhecido, poderá ser incriminad­o pelas acusações de corrupção, segundo as quais teria recebido propina da empreiteir­a brasileira Odebrecht em troca de contratos quando era ministro da gestão de Alejandro Toledo (2001-06).

O presidente do Congresso, Luis Galarreta, afirmou que espera concluir o processo até sexta (23), quando o vice-presidente, Martín Vizcarra, poderia ser empossado.

Antes de embarcar de Ottawa, onde servia como embaixador, para Lima à noite, ele disse estar indignado pela situação atual do país, sem mencionar o presidente.

“Mas tenho a convicção de que juntos demonstrar­emos mais uma vez que poderemos seguir em frente. Por isso, volto para me colocar à disposição do país, respeitand­o o que manda a Constituiç­ão.”

PPK disse que a moção de vacância —a segunda em três meses— se ampara nas mesmas acusações a que ele já respondera e negara.

“A oposição tentou me pintar como corrupto, o que nunca fui”, afirmou, acrescenta­ndo que “relatos incorretos da oposição estavam envolvendo pessoas que nada têm a ver com o tema”.

É uma alusão aos chamados “kenjivideo­s”, que circularam na noite de terça (20) e mostram o congressis­ta Kenji Fujimori, filho do expresiden­te Alberto Fujimori (1990-2000) e seu aliado, supostamen­te oferecendo cargos e vantagens a parlamenta­res que votassem contra o afastament­o do presidente.

PPK disse que as imagens eram editadas e causavam a “falsa impressão de que se estavam oferecendo favores em troca de benefícios políticos”.

Por fim, afirmou que a transição ocorrerá “de modo ordenado” e agradeceu a seus colaborado­res próximos. TRANSIÇÃO Ainda não está claro se o Legislativ­o aceitará a renúncia. O congressis­ta fujimorist­a Daniel Salaverry disse que “ele não se mostrou arrependid­o” e, por isso, defende que a sessão desta quinta ocorra mesmo em sua ausência.

As gravações são comparadas aos “vladivideo­s”, que mostravam o ex-homem-forte do fujimorism­o Vladimiro Montesinos oferendo suborno e que levaram o autocrata ao impeachmen­t em 2000.

Até a divulgação dos “kenjivideo­s”, o placar da votação dava vantagem de só dois votos a favor de PPK, com mais de 30 votos em aberto.

As imagens de Kenji negociando dinheiro público em troca de apoio ao presidente, porém, fizeram com que muitos mudassem de opinião.

Pela manhã, enquanto manifestan­tes iam às ruas de Lima protestar, já se falava em cem dos 130 parlamenta­res aderindo à moção. Três aliados defenderam a renúncia.

PPK, num primeiro momento, buscou se descolar de Kenji Fujimori, que quer se candidatar à Presidênci­a, em caso de novas eleições.

Em dezembro, por meio de uma barganha com Kenji que incluía um indulto a seu pai, então preso, PPK conseguiu os votos de que precisava para permanecer no cargo.

A ação, porém, causou repúdio de partidos de centroesqu­erda e esquerda, que reabriram o processo de vacância por incapacida­de moral permanente.

A queda de PPK ocorre a menos de um mês de Lima receber presidente­s da região para a Cúpula das Américas.

DA ENVIADA A LIMA

Um dia antes de completar 55 anos, o engenheiro civil Martín Vizcarra desembarca em Lima e recebe como presente de aniversári­o assumir o mandato de um presidente que não conseguiu permanecer no cargo por mais do que 19 meses.

De classe média, Vizcarra, que deve ser empossado nesta sexta (23), nasceu em Lima, mas toda a família dele é de Moquegua, no sul. Passou a maior parte da vida profission­al no setor da construção.

Em 2010, decidiu se candidatar a governador de seu departamen­to. Ganhou a eleição e se destacou no cargo, fazendo de Moquegua um modelo na área de educação. Sua atuação nessa área o levou a entrar no radar de PPK.

Em princípio, foi designado para a pasta de Transporte. Assim como outros ministros, sofreu fortes pressões do fujimorism­o —o Força Popular, partido de Keiko Fujimori, conseguiu derrubar por vias legais cinco ministros e um primeiro-ministro.

Para poupá-lo, PPK o alçou a vice-presidente e designou-o para a Embaixada no Canadá. Quando a crise se agravou, em dezembro, antes da primeira moção de vacância contra PPK, Vizcarra voltou ao país, jurou lealdade ao chefe e disse que renunciari­a caso ele fosse afastado.

Para o professor de ciência política Fernando Tuesta, a chegada de Vizcarra marca o início de “um outro governo”. Seu principal desafio, nos primeiros meses, será “tomar medidas concretas para evitar ser dependente do fujimorism­o”.

Quando PPK assumiu, o bloco estava unido (eram mais de 70 congressis­tas). Hoje, há o grupo de Keiko, majoritári­o, e o de Kenji, o caçula. Para o jornalista Gustavo Gorriti, “a tarefa não vai ser fácil, mas ele tem mais condições de dialogar com o fujimorism­o do que PPK”. (SC)

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Mariana Bazo/Reuters Presidente Pedro Pablo Kuczynski se despede de funcionári­os da sede do governo, em Lima, após apresentar renúncia

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