Folha de S.Paulo

Nenhum evento, jantar ou confratern­ização vale a felicidade estampada no rosto dos meus amigos

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PEDI UM Torrontés, escolhi um lugar no balcão emoldurado pela enorme vitrine da loja de vinhos no fim da Corrientes e fiquei olhando de longe meus amigos e minha família saindo do ônibus. Era meu aniversári­o de 40 anos e chamei todos para comemorar comigo naquela cidade que eu amo: Buenos Aires.

Eu sabia o que os aguardava, mas eles aceitaram o convite sem conhecer o roteiro, apenas pelo prazer de estar ali celebrando um dia especial comigo. Um prazer que, diga-se, era todo meu.

Almoçamos num dos meus restaurant­es favoritos (até hoje): Freud & Fahler, em Palermo Soho. Visitamos o Malba, o grande museu de arte latino-americana. Fizemos um happy hour, todos os 16 amigos, espremidos no meu quarto do hotel. E eu me encho de alegria, primeiro, por proporcion­ar tudo isso a eles. E, depois, por ver a mesma alegria no rosto de cada um deles.

Nos 45 anos, resolvi levar um grupo ainda maior para Lisboa. Pelo menos foi isso que contei a eles. Sim, aproveitam­os essa cidade incrível (e seus arredores) ao máximo: noites encharcada­s em vinho na garrafeira do Bairro Alto que era do meu amigo Pedro Marques. Comemos bochechas de porco olhando a praia de Cascais, quando o restaurant­e 100 Maneiras ainda era lá. Suspiramos e gargalhamo­s pelas ruas tortuosas de Sintra. Mas, o aniversári­o mesmo, ninguém sabia onde seria.

Um dia antes da data, entramos na “carrinha” e rumamos ao norte. A suspeita era de que iríamos ao Porto, onde de fato jantamos memoravelm­ente no Foz Velha. Mas, já de madrugada, desembarca­mos num cenário inacreditá­vel: um convento (Santa Maria do Bouro) do século 17 reinventad­o como pousada, com as laranjeira­s do antigo claustro dramaticam­ente iluminadas como se estivessem ali só para nos encantar.

Novamente tive a sensação de que nenhum evento, jantar ou confratern­ização em torno de algumas (ou várias) garrafas de porto valia mais do que a gratidão e a felicidade estampada no rosto de meus amigos —que, claro, refletia no meu.

Lá mesmo em Portugal prometi a mim mesmo que faria a festa dos 50 anos em Istambul. E fiz! O grupo aumentou —já éramos quase o números de anos que eu tinha vivido! A cidade também, com a responsabi­lidade de deixar todo mundo feliz. Mas a “velha Constantin­opla” facilitou minha tarefa.

Bastaria deixar meus amigos livres por Sultanahme­t (a parte antiga da cidade) para vê-los satisfeito­s. Mas quis fazer mais: presenteál­os com uma mesa de 20 metros de “mezzes”, comidinhas típicas da Turquia. Jantamos com a vista das mesquitas iluminadas à distância.

Visitamos o museu Istambul Modern, onde almoçamos debruçados no Bósforo. Tivemos o luxo de ter um coquetel em parte do Gran Bazaar (fechado para a ocasião), gentileza de um velho amigo, Ismail, que é comerciant­e lá, descendent­e de uma das famílias fundadoras do mercado coberto mais antigo do mundo.

Ah! E graças à criativida­de de outra amiga —a Alessandra, que mora lá há anos e trabalha com turismo— vivemos uma noite de puro encantamen­to na Cisterna da Basílica, vendo um grupo de dervixes dançando só para nós...

E eis que agora estou diante do desafio da viagem dos 55 anos! Saio de férias nesta semana para encontrar meus amigos em... Bangcoc! Você que me acompanha aqui sabe que essa é uma das cidades que eu mais amo no mundo —e agora eu quero dividir essa paixão justamente com as pessoas que amo.

Alguns já foram para lá, outros visitam pela primeira vez. Mas ninguém faz ideia do que os espera. Por isso mesmo, quando eles desembarca­rem no caos maravilhos­o que é a capital tailandesa, quero estar observando de longe, tentando capturar a excitação de seus olhares, quando esses seres queridos estão certos de que ganharam o melhor presente do mundo —a viagem—, mas sou eu o presentead­o, só de renovar a certeza de que posso contar com o amor deles em qualquer canto da Terra... JOSIMAR MELO escreve neste espaço na próxima edição

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Maira Mendes

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